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terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Ano de 2.010!



A todos amigos e visitantes do blogger,
desejo um ANO NOVO pleno de alegrias,
muita Paz, Saúde e Realizações.
Feliz, Ano Novo Cristão, de 2.010!

Maria Madalena

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Prece



dá-me a lucidez das
correntezas para que eu descubra
entre as tristezas que se
avolumam algum
sorriso mesmo
que não seja para mim

dá-me a serenidade de uma
estrela para que eu imagine
entre as lágrimas que não
me deixam qualquer
paz ainda
que breve

dá-me a claridade das
luas cheias para que eu invente
entre as angústias que se esparramam um
horizonte mesmo
que se transmude em ilusão

dá-me a esperança das
árvores para que eu teça
entre as ausências que se
imensificam uma sanidade ainda
que estofada de
delírios


Adair Carvalhais Júnior
(Minas Gerais)

domingo, 27 de dezembro de 2009

Eu e Ela



Não tenho intimidade mais
com a minha solidão,
estamos há longo tempo
distantes um do outro,
mas como velhos amigos
eu e ela sabemos
que nos queremos demais.

Não tenho mais tempo
assim busco no tempo
novas companhias
em desvario
de novos momentos
ou a calma de um
suave encontro,
preciso ganhar
todas as horas.

A solidão,
ela me espera,
com ela algum tempo
terei para recordar
minha vida de quimeras,
eu e ela.

Luiz Alberto dos Santos Monjeló
(R.G. do Sul)

domingo, 20 de dezembro de 2009

AS LUZES



Descolorindo a tarde
Abrindo as portas da noite
E liberando as estrelas em rebanhos líquidos
De luzes.

Não posso olhar sem impregnar
As lembranças de fotografias e imagens
Retorcidas, no aço das lâmpadas
Nas ácidas incursões da estante
De livros quando a lâmpada se ascende
Ascende-se um fio de sonhos e uma coberta de imaginações

As páginas dão conta dos fatos que em vão vivemos, que deveríamos ter posto a prova.
As palavras não ditas inclinam aos olhos cansados, uma multidão de imagens baças em
prontidão com os elementos invisíveis que infestam as nossas cansadas pálpebras...

A pequena estrela
É a porta e a chave
Para as pequenas
E infinitas coisas
Que juntamos
Que perdemos
Ao nos olhar
sem pressa, para a vasta planície deserta do espelho.

Não há uma formula para o desconhecido
O secreto que há em cada palavra
Ativa o homem que se esconde a cada página virada.

Georgio Rios
(Bahia)

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

As Horas



As Horas cismam no ar parado:
— Passado.
As Horas bailam no ar fremente:
— Presente.

As Horas sonham no ar obscuro:
— Futuro.


Da Costa e Silva
(1885-1950)

Diálogo Interior...



Ante o infinito,
Cismo e medito.
Mas vou pensando
E interrogando.

Dialogo a esmo
Comigo mesmo.

— Tudo convida
A amar a vida.

— E amar se deve
A um bem tão breve?

A vida é bela
No que revela...

— Mas como existe
O homem tão triste?

— A vida é a luta
Divina e bruta.

— Onde o heroísmo:
Páramo ou abismo?

— A vida encerra
Os bens da terra.

— Se esses dons temos,
Por que sofremos?

— A vida inquieta
É a mais completa.

— Mas por que a alma
Aspira à calma?

— A vida é intensa
Para quem pensa.

— E onde a esperança,
Que não descansa?

— A vida é pura
Quando há ventura.

— E por que sinto
A ânsia do instinto?

— A vida é chama,
Que apura e inflama.

— Por que a resumo
Em névoa e fumo?

— A vida é a glória
Sempre ilusória.

— Mas como é insano
O sonho humano?

— A eterna esfinge
Ninguém atinge...

— Que reticências
Nas existências!


Da Costa e Silva
(Piauí -1885-1950)

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

'PRIMAVERA I'



Verei a primavera se encaminhar com o seu chapéu de
palha e o seu róseo vestido
Pelas ruas amigas, perto da casa em que mora.
Verei o teu rosto se tingir com a poeira dos ocasos
E tuas mãos morenas se balançarem tênues sob a água das cascatas
Longe das ingratidões, das lutas, dos equívocos de todo dia.
Os cisnes se confiarão como nos tempos calmos.
As violetas distantes sorrirão com as terras úmidas e grávidas.
Os pássaros, os ninhos vão cantar!
Verei chegar o teu vestido e te confundirei com a Primavera.
Seguirei com a Primavera pelas ruas.
Os circos vão pousar como pássaros enormes.
Primavera! Primavera!
O amor vai renascer nos campos
E as amadas dormirão cobertas pelos azuis sem fim.


Augusto Frederico Schmidt
In: Um século de poesia
(Rio de Janeiro-1906-1965)

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

AS FLORES ESTÃO CHORANDO


Os lilases murcharam . . . As roseiras,
Ao castigo do outono, estão despidas . . .
Hão de viver assim horas inteiras,
Mergulhadas nas sombras esquecidas . . .

Outrora foram elas mensageiras
Das alegres paisagens coloridas . . .
Hoje ostentam nas hastes agoureiras.
A tristeza das rosas fenecidas . . .

Desce a noite orvalhada sobre os mirtos,
A secura das plantas abrandando
Na frouxidão letal dos cravos hirtos!

Enquanto o orvalho se transforma em bolhas
Que pelos ramos murchos vão rolando
Como se fossem lágrimas das folhas! . . .

Miguel Jansen Filho
(Paraíba 1925/1994)

'MADRUGADA EM MEU JARDIM '


Um divino clarão vem do nascente
E sobre o meu jardim calmo resvala!
Na graça deste quadro reluzente,
A aragem fria os meus rosais embala!

Tudo desperta misteriosamente!
E a luz cresce e se expande em doce escala,
Avivando o Iençol resplandescente
Da brancura dos lírios cor de opala!

E o sol, doirando as franjas do horizonte,
Celebra a missa do romper da aurora
Na doce Eucaristia do levante!

Da passarada escuta-se o clarim !
E a madrugada estende-se sonora,
Na aleluia de luz do meu jardim !

Miguel Jansen Filho
(Paraíba 1925/1994)

SONETO SEM NADA


Um grande sonho que nunca sonhei,
uma outra vida que nunca vivi,
um longo choro que nunca chorei,
um bom sorriso que nunca sorri,

um juramento que nunca jurei,
uma mentira que nunca menti,
uma ansiedade por que nunca ansiei,
um fingimento que nunca fingi,

uma lembrança que nunca lembrei,
uma descrença em que nunca descri,
uma esperança que nunca esperei,

um sentimento que nunca senti,
um pensamento que nunca pensei,
um sofrimento que sempre sofri.

Guilherme de Almeida
In: Os Sonetos

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Predileção



Amo os gestos estáticos, plasmados
numa atitude lenta de abandono;
certos olhares bêbedos de sono
e a poesia dos muros desbotados...

Amo as nuvens longínquas... o reflexo
na água dos foscos lampiões...as pontes...
a sufocação ríspida das fontes
e as palavras poéticas sem nexo.

Mas, sobretudo, eu amo esses instantes
em que, como dois presos foragidos,
os meus olhos se embrenham, distraídos,
na natureza - como dois amantes...


Onestaldo de Pennafort -
em Poesias
(Rio De Janeiro-1902-1987)

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Reflexões



Um barco passa ao longe
Na linha do horizonte.

Passa o tempo,
uma alegria, alguns sorrisos
Muitos sonhos, algumas dores
Muitos amores, poucas verdades

Um adeus,
algumas lágrimas, recordações
como no horizonte ao pôr-do-sol
Vão se esfumando as lembranças

Que importa se desce a sombra
Se tudo já é passado.
Navega comigo,
Até que a noite desapareça.

Ana Carlini

sábado, 28 de novembro de 2009

AS COLEÇÕES



Em primeiro lugar as magnólias.
Com seus cálices
e corolas: aquarelas
de todas as tonalidades e suma
delicadeza do toque.
Pequena aurora diluída
com doçura, nos tanques.


Depois a musica: frêmito
e susto de passaro.
As valsas – que sorrateiras. E as flautas.
As noites com flauta sob a janela
inaugurando a lua nascida
para o suspirado amor.


Mais tarde os campos, as grutas,
a maravilha. E o caos.
Com seus favos e suas hidras,
o mundo. O mar com seus apelos,
horizontes para o éter,
desespero em mergulho.


Com o tempo, o ocaso. As lentas
plumas, os reposteiros
com seus moucos ouvidos,
a tíbia madeira para
o resguardo das cinzas,
as entabulações – e com que recuos –
da paz.


Finalmente os endurecidos espelhos,
os cristais sob o quebra-luz,
dos ângulos o verniz,
o ouro com parcimônia, a prata,
o marfim com seus esqueletos.


Henriqueta Lisboa
In:'A Flor da Morte' (1945-1949)

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

"SALMO DO SILÊNCIO"



Tão grande é meu silêncio que ouviria
uma hóstia pousar sobre uma nuvem ,
a floração de estrelas no abismo
e o murmúrio de Deus amando o mundo.


Neste convulso silêncio escutaria
uma luz caminhando no infinito
e a tristeza de um anjo abandonado.


Tão puro meu silêncio que escuto
o solitário coração de Deus
fluindo angústia. E às vezes sinto
desdobrar-se em silêncio e mais silêncio
a grande voz a murmurar meu nome
na negra solidão inacessível.


Yttérbio Homem de Siqueira
de "Abismo Intacto"
(1932-1981-RG do Norte)

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

ÁRIA PARA VIOLINO


Para nadar no silêncio
ergo as mãos extraviadas;

são estrelas acordadas,
ou meu eco em seu silêncio.

Escorre pelo que sinto
meu perfil escrito e ouvido

e em som e cor divido
entre mim e o que não sinto.

Colombo de Souza
in:Estágio
(Curitiba-1920)

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

O EXÍLIO



(da terceira Rosa do Oriente)

Insensato destino, ao roubar-me a ventura,
de ser rosa nos campos do meu florescer.
De furtar-me os mistérios da extrema doçura,
que um profano cultivo não sabe antever.

Exilada a um terreno deserto, de agrura...
O esplendor do meu ser faz, em mim, fenecer!
No mosaico de um chão, sem calor, sem ternura,
me retorno aprendiz... Não mais quero viver!

Jogo ao vento os retalhos banhados de orvalho,
guardo o verde florir e em negror me agasalho...
Dantes, se rosa fui... Hoje sou flor qualquer.

Pois quem foi meu poeta, ficou tão distante...
Pereceu na perfídia do agora inconstante...
E da rosa não resta o perfume, sequer!


- Sarai Jahwel -

'TERCEIRA ROSA DO ORIENTE'



Ô, insensatez humana convencer as rosas
de que das rosas todo o tema se esgotou!
Quantos mistérios há nas faces luminosas
das rosas da manhã que ainda não raiou...

As rosas são dotadas de almas poderosas
que o escultor das primaveras reinventou
num paradoxo de impressões prodigiosas
tal retocar a flor que Deus não terminou.

Eu canto as rosas que replanto no jardim
as desfolhadas pelas frias mãos do vento
que feneceram de ser uma flor qualquer.

Eu canto a rosa do último poeta em mim
a que folheia o livro do meu pensamento
e sangra por amor no ventre da mulher!


Afonso Estebanez

'A CARAVANA'



(resposta à Primeira Rosa do Oriente)


Eu sinto o vento a encobrir os passos
da caravana, rumo ao ocidente;
rompe, em seu curso, milenares laços...
Mata o passado... E o amor nele existente.

Desertos, vales... Todos os espaços,
são ocultados num cantar plangente...
Canto que embala a rosa, em sonhos baços...
Outros jardins... Não mais o sol nascente.

E há tanta dor nos braços da partida...
Tanta ventura feita vã, perdida...
Como olvidar sentir tamanho, assim?

Onde o refúgio do porto altaneiro,
das ternas mãos do amado jardineiro...
Senhor, responde: o que será de mim?


- Sarai Jahwel –

'PRIMEIRA ROSA DO ORIENTE'



Há milênios construo entre ternuras
uma estrada de rosas que inauguras
em cada amanhecer de minha vida...

Assim, então, jamais sequei deserto
eis do teu sonho nunca me desperto
a não te ver ausente e adormecida...

Do Oriente ao Ocidente teu perfume
foi sempre a via etérea afeita e afim:
ao teu destino de ser meu queixume
em meus destinos de ser teu jardim.

Jardim da aurora que me fez a lume
lume da rosa de teu ventre em mim:
Rosa do Oriente que o amor resume
no amor das rosas com amor assim!


Afonso Estebanez

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

'A ROSA SE DESNUDA'



(uma resposta à Segunda Rosa do Oriente)


Não há no tempo a poção de magia,
que traga à rosa o seu primeiro encanto.
Foi-se-lhe a vida... Jaz em agonia,
por não mais ter a voz do próprio canto.

A primavera... Deus, que nostalgia...
Que padecer, que dor... É tanto o pranto...
Onde as sementes? Rosa tão vazia...
Rosa desnuda de cor e acalanto!

Misericórdia, céus, ouve-me a prece,
todo o esplendor da rosa, em mim, fenece...
E o desespero é qual o mar... Crescente.

É lua plena, de paixão e sangue...
É rosa morta, de tristeza, exangue...
Buscando as sendas do Grande Oriente.


- Sarai Jahwel -

'SEGUNDA ROSA DO ORIENTE'



Não vejo o dia de chegar o tempo
em que de rosas seja toda espera
como nos dias em que fico atento
e invento rosas para a primavera.

Não há deleites a não ser o alento
de ver o tempo regressar com ela
da doce esfera do contentamento
ao venturoso amor que regenera.

O amor da rosa que virá semente
do meu jardim secreto do oriente
para os canteiros rústicos do mar.

Talvez a vida seja o mar de rosas
que a despeito das vias arenosas
não se ferem nas pedras do luar.


Afonso Estebanez

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Forma de luz



A luz quando desvenda a vida
cria formas, alastra quem informa
devora males e cria forma

Verdeja sonhos num mar perdido
tal andarilho esvoaçante
de harmonias raras

Cinge minha alma como carícia,
serena e renovada
encerrando desacertos e desconsolos
pois tudo acaba ao se desprender
nas dúvidas de algumas reticências...

Conceição Bentes
Publicado no Recanto das Letras em 25/10/09
Código do Texto: T1886632

SOMBRA



A tarde entrou pela janela, como um hálito.
Na transparência do ar, que tem cheiro de mato,
Uma andorinha passa perdida, voa sem pressa.


No espelho imóvel dos brejos
A água prolonga o céu e uma primeira estrela.
O crepúsculo vem vindo, desce dos morros.


Não tarda, o véu sutil feito de cinza esparsa
Todo me envolvera em sua grande sombra
E outras estrelas brilharão na água dos brejos.



Ribeiro Couto
In: Melhores Poemas
(São Paulo- 1898-1963)

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

ROSA ENLUARADA



A rosa vermelha,
fresca e orvalhada,
sobre o teclado frio,
inerte, pousada
diz mais que muito.

A rosa vermelha,
tenra e molhada,
sobre o teclado cria
e verte o dito quieto.

A rosa vermelha,
infante e felina,
sobre o teclado ousa
dizer mais que muito.

A rosa vermelha,
invade meus olhos.
Nada teme: inteira sua;
é lua nua em íntimo culto.


Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"

LUAS BRANCAS



O medo de te perder
é o medo de me encontrar
- e trevo silente
ao sem-eira do vento
ao remoinho das brancas luas
retornar

Síndrome das crateras vagas
das horas nuas.

( Ai do estéril ventre
de toda antiga ausência
da sombra das palavras tuas.)


Fernando Campanella,
DE 'O EU CONFESSO'

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Do meu outono



O outono vai chegar... Neva a névoa do outono...
Perdem-se astros sem luz... Anda em choro a folhagem...
Há desesperos silenciosos de abandono...


O outono vai chegar... Neva a névoa do outono...
E eu sofro a angustia irremediável da paisagem...


O outono vai chegar... O outono vem tão cedo!
Irão morrer flores e estrelas, como as crianças
Tristes e mudas, que impressionam, fazem medo?


O outono vai chegar... Têm vozes do passado
As horas loiras, a cantarem vagarosas,
Com ressonâncias de convento abandonado...


Vozes de sonho, vozes lentas, do passado,
Falando coisas nebulosas, nebulosas...


O outono vai chegar, como um poeta descrente
Que funerais desilusórios acompanha...


O outono vai chegar... Neva a névoa do outono...
Perdem-se astros sem luz... Anda em choro a folhagem...
Há desesperos silenciosos de abandono...


O outono vai chegar... Neva a nevoa do outono...
E eu sofro a angustia irremediável da paisagem...



Cecília Meireles
In: Baladas para El-Rei (1925)

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Não há razão nem tempo



não há razão nem tempo em ser amada
enquanto as tardes desfizerem a vida
e no sono desvirtuem-se as manhãs
não há canto na melancolia
no quanto hesite a palavra luz
mas quando não houver segredo
e nem ruído que rasure a madrugada
se a verdade amordaçada
respirar
e de teus dedos escorrerem prantos
pelos anos de nunca e mais e tantos
tu te morrerás
e eu deixando enfim a nódoa
transparente
libertarei a aurora ao tom
da tempestade
e deixarei que me inunde
a paz

Lilia Silvestre Chaves
in 'E todas as orquestras acenderam a lua'
(Belém do Pará - 1951)

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Contigo



nas brumas do escuro mar
ou nas areias frias de um deserto
num breve segundo, a eternidade
nas tristes sombras da saudade
impensada dor da minha treva

depois, de tão cansada caminhada
de solitária dor, alma sofrida
pelos caminhos rudes desta lida
contigo, em meus braços, minha vida,
...impensada luz da minha treva


reginahelena
(sem verbo)

domingo, 8 de novembro de 2009

Flores no caminho



Há flores no caminho
não ando sozinho
Camélia, margaridas, sempre-vivas
rosas sem espinho
semeadas com carinho

No caminho há flores
em meu coração muitos amores

Há flores no caminho
em cada estação um ninho
nos lábios, o paladar do vinho
no leito, a seda e o linho
nas memórias, o frescor do pinho

Certamente há flores no caminho...


Úrsula Avner
(Minas Gerais)
Poema do site da autora; 'A alma da poesia"

sábado, 7 de novembro de 2009

POEMA DA SOLIDÃO



Cada dia que passa, cada dia
que me leva um anseio e que me traz
uma fadiga para o coração,
sinto mais o perfume de poesia,
o êxtase lívido, a pureza e a paz
da minha solidão.

Depois das noites carpideiras,
quando um queimor de lagrimas enxutas
punha goivos na cova das olheiras,
ai! quantas vezes me internei nas grutas
para esconder as faces!
E tive sempre alguém que me guardasse
a entrada como um cão:
minha bravia solidão.

Nos sonhos claros de felicidade,
quando quis estar só para a esperança
de sorrir e viver,
nem mesmo por piedade
me disse que o sorriso também cansa,

nunca toldou de leve o meu prazer
porque sabia que era tudo em vão,
minha profunda solidão.

Nas horas doentes de mormaço,
quando o jardim já deu todas as flores
e as aranhas do tédio, passo a passo,
enchem de teia os templos interiores,
e se pergunta à vida por que é bela,
tenho o consolo da meditação
ao sentir a alma como um barco à vela
no oceano da solidão.

Quando o vulto da morte, sonolento,
pousar à flor da terra essa bandeira
que ergo às nuvens na mão,
- calma, no orgulho do desprendimento,
minha palavra derradeira
quero dizê-la à solidão.



Henriqueta Lisboa
In: Melhores Poemas
De Velário (1930-1935)
(Minas Gerais 1901-1985)

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

ÂNSIA VERTIGINOSA


Forças que me levais por sobre o Oceano,
Para as fluidas regiões incompreendidas,
Onde se transfigura o ser humano
Na essência misteriosa de outras vidas,


Dai-me, como sabor do ultimo engano,
Neste mundo de graças desmentidas,
A ilusão de sentir-me sobre-humano,
Por estas amplidões indefinidas . . .


Na orgia, aqui, do Sol e das distancias,
Sonho, sentindo uma revoada de ânsias,
Ser chama – asa das ultimas vertigens –


Para, no ar, difundir-me em claridade
E, como o dia – espasmo das origens –
Fecundar de meu ser a Imensidade!



Luis Carlos
In: Amplidão

O SOM DAS ÁGUAS DOCES



Fazer feito o fiel verdureiro:
equilibrar nos ombros largos
dois cestos; ambulante resoluto -
presença diária no pequeno mundo
da enorme fome dos homens simples.

Conferir, compete ao aventureiro:
cada conta pendurar no avental
de quantos aventam saltar,
de inteiro corpo, na tempestade
da afoita vida dos homens simples.

Atentar, cabe àqueles que expiam
tantas perdas; que sonham oceanos
de inéditos pecados ao pé do altar.
Do profano ao sagrado, cabe àqueles
espionar a fantasia dos homens simples.

Avançar, confere venturas a quantos,
atrevidos, gravam nos seixos dos rios
o inominável, o índigo, o quieto Quasar,
e o som dos espíritos das águas doces -
que banha a vida dos homens simples.


Jairo De Britto,
em “Dunas de Marfim”

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

d' água que brota na fonte do ser



vou saciar a sede eterna
cantar com a chuva mansa
cambiar sentimentos
tudo que ilumina o sorriso criança

serei as asas
orvalhadas
nas águas cristalinas de suas retinas
gritarei seu nome ao infinito
completar o nada
com o brilho do amanhecer


José Geraldo Neres
(São Paulo)

domingo, 25 de outubro de 2009

"Púrpuras"



Na púrpura do Verso o outro do Sonho ardente,
Fio a fio, teci. Era manhã! Radiava
Em pleno azul meu belo sol adolescente.
E o meu Sonho, a essa luz, resplendia e cantava.

Como a enrediça, a vida, indomada e ascendente,
Por minha mocidade em mil voltas serpeava.
E tudo, no esplendor de um mundo renascente,
Sonoro, multicor, multímodo, vibrava.

Musa, que não gemeu flébil, magoada e langue:
Vivaz, tonto de luz, salta o primeiro verso,
Ao primeiro rebate estuoso do meu sangue.

Ó seivas tropicais! Ó sonoras luxúrias!
Mundo excelso do Sonho, esvoaçando, disperso,
No incontentado ardor dessas rimas purpúreas!


Arthur de Salles
In: ""Sete tons de uma poesia maior "
Uma leitura de Arthur Sales –Cláudio Veiga- Edt. Record 1984

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

ERMO ABSOLUTO



Desiludido da clemência humana,
Para a minha agonia de viver;
Arrastando comigo a caravana
Dos fantasmas que surgem do meu ser,


Busquei a solidão que nunca engana,
Onde, vendo-me virgem do prazer,
A poesia se fez Samaritana,
Para o azul da Amplidão dar-me a beber.


Mas, si eu, antigamente, era tristonho,
Agora, pelo Espaço, em pleno sonho,
Somente, acho extensão para os meus ais!


Somente, ébrio de abismos, quando grito,
Responde-me dos ermos do Infinito,
O silencio das cousas imortais.


Luis Carlos
In: Amplidão
(Rio de Janeiro- 1880-1932)
Membro da ABL

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

ALBA



Não faz mal que amanheça devagar,
as flores não têm pressa nem os frutos:
sabem que a vagareza dos minutos
adoça mais o outono por chegar.
Portanto não faz mal que devagar
o dia vença a noite em seus redutos
do leste — o que nos cabe é ter enxutos
os olhos e a intenção de madrugar.


Geir Campos
in 'Cantigas de acordar mulher'

MORTE... VIDA...



Se existe um amanhã... Um "logo mais"...
Quem sabe, onde a certeza do momento?
Viver, morrer... É tudo tão fugaz...
Efêmero... Qual é o pensamento.

Se agora, aqui... Em breve o corpo jaz
em meio ao canto triste do lamento.
Os sonhos... São entregues ao jamais...
Os planos... Perdem-se em esquecimento.

O Agora é tua vida, teu instante,
traze bem junto a ti quem é distante,
quem dá sentido a tu'alma, ao teu amor.

Pois só o amor conduz à eternidade,
o mais... O mais é vão, tola vaidade,
que em si traz o vazio, angústia e dor!

- Patricia Neme -

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Trovas



Tudo muda... O tempo avança...
Vai-se a vida...O globo roda,
mas com lastros na esperança,
sonhar nunca sai de moda.

¨¨
Embelezo o meu viver
com sorriso, amor e empenho,
pra jamais vir a perder
os amigos que mantenho!

¨¨
Posso dizer que a esperança
Que a vida faz renascer,
É um mito que não se alcança,
Mas como ajuda a viver...


¨¨
''Como cultivo amizades
e sou bom agricultor,
irão escrever: "SAUDADES",
na campa aonde eu me for.''

Miguel Russowsky

(-21 de jundo de 1.923 + 03 de outubro de 2.009)
Nossas homenagens ao poeta recentemente falecido.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

É O MAR. . .



É o mar que permanece – é sempre o mar
das esperas, que acende
os olhos,
para no exausto coração deitar
o silencio das praias e das ondas
a lassidão; é o mar que permanece
e faz da solidão da criatura
a solidão da água
que a circunda.


Alphonsus de Guimaraens Filho
In: Antologia Poética

ANOITECER NA LAGOA



Os juncos flexíveis contemplam a noite chegar ocultando
o injusto reino dos homens – triste reino dos homens.
A grande sombra vai aos poucos se infiltrando, e com ela um
quase remorso,
a consciência de que tudo, ai de nós! podia ser mais belo.



Alphonsus de Guimaraens Filho
In: Antologia Poética

POEMA DE ANIVERSARIO



Foge o homem para o centro do deus que o persegue
e risca na própria pele a beleza da morte,
o provado desenho de uma infância, estas formas
que a minúcia do olhar recompõe na cegueira.


Já não sente os cavalos, nem recorda o que cerca
a sozinha indolência que revê no destino
de estar, rosto na relva, eterno e antigo, vindo
do sol sobre as clareiras para a limpa tristeza.


Segue os céus que repartem, entre o certo e o difuso,
o sonhar exilado do que breve lhe fica,
do que traz sobre os ombros, como achas, a vida,
só instante e distancia, pobre húmus sem uso.


E joga o ser chorado e o que foi (recolhido
na sobra do menino que lhe fala ao ouvido)
sobre o colo e o abandono do deus que flui, calado,
entre muros de cinza, solidão e cansaço.



Alberto da Costa e Silva
In: As Linhas da Mão (1978)
(São Paulo - 1931)

sábado, 10 de outubro de 2009

Além dos Sonhos



Vôo além dos sonhos,
no fictício azul
que a luz do horizonte deixa ver,
o ondulado da poeira morta
ante o suspiro de um lamento

Meus sonhos sem costuras,
elidem as palavras das arestas,
onde o silêncio especula
o palpável desalento

Estás além de tudo,
permaneces imponderável
nas hipotéticas estrelas,
ponto eqüidistante de partida e chegada,
passagem silenciosa do eterno sempre

Conceição Bentes
Publicado no Recanto das Letras em 03/10/09
Código do Texto: T1845477

Passagens



Poderia ter sentido
o perfume da vida
passando entre as flores
que se encantam,
dissimulando asperezas
nas pétalas umedecidas

Prenderia tua imagem
no acústico de uma sonata,
no calor do sol ressacado
de um verão

O vento em suas rajadas afiadas,
cortará a saudade insuportável,
falando do amor
como quem fala da sede,
da fome, da dor.

Conceição Bentes
06/10/09

CHUVA?



Do céu cinzento, chega a chuva fina...
Vem mansamente, quase em desalento.
E chove, chove... Nunca que termina...
É chuva d’água... Ou chove sofrimento?

A terra dorme sob a gris neblina,
o tempo para, já não canta o vento...
Nem leve sol, a vida descortina...
É chuva d’água, ou chuva de lamento?

E vão-se o dia, noite, madrugada...
E sempre a chuva, tão desalentada...
Minh’alma indaga às nuvens: até quando?

Até que exista paz, amor, verdade,
e todo humano viva a boa-vontade...
Não vês? Não chove... Deus está chorando!

- Patrícia Neme -

PAI NOSSO


(Tadeusz Makovsky-1882-1932)

- porque há crianças... -

Pai nosso, Pai de toda a criançada,
estás longe no céu, por qual razão?
Te assusta tanta vida aniquilada,
Te agride ver a infância sem ter pão?

Do céu, ouves a mãe desempregada,
que implora por Tua Graça e Compaixão,
pra que a família seja alimentada
e os filhos tenham teto e educação?

Escutas a menina que é estuprada,
gritando de terror, dor, solidão?
E o jovem, cuja vida é ameaçada,
pra que seja, do tráfico, avião?

Tens visto que há criança escravizada
e, por salário, só ganha um tostão?
E aquela, que a chuva deixa assustada,
pois teme vá ao chão seu barracão?

Pai nosso, tanta coisa está errada...
Falta respeito, falta proteção...
Deixa, um pouquinho só, Tua morada,
vem cá, os filhos Teus estão sem chão!

- Patrícia Neme -

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

VELHO TEMA



Na carícia de místico segredo
vivia humilde como flor na gruta,
quando, a medo,
deixei o meu refúgio e o alvo manto
de meu pranto,
para confiar-te a triste calma
de minha alma.
Enfeitei toda a casa de guirlandas
como um presépio, e tremulo te disse
coisas brandas,
querendo unir a sombra dos meus olhos
aos teus olhos,
nesse tímido amor que é a beleza
da tristeza.

Mas quando te conheci que criado havia
nas linhas do teu corpo a branca estátua
da poesia,
riste ... enquanto aos meus olhos rasos de água
pela mágoa
vagava alguém num barco pelas brumas:
o amor resignado entre a ironia
das espumas.

Miguel Reale
In: 'Poemas do Amor e do Tempo'

Mercedes Sosa


Mercedes Sosa- San Miguel de Tucumán, 9 de julho de 1935
— Buenos Aires, 4 de outubro de 2009)



Mercedes se fue al cielo,
cantar para estrellas
que alumbran los ensueños de poetas.
Mercedes,
que buscaba libertad…
Ahora es pájaro libre
en la eternidad.
Así era necesario.
El hombre común ya no oye
las voces del miedo o dolor
que vienen del vientre de la tierra.
Pero un poeta…
Ese si conoce
el sentido del brillo
que una estrella encierra.
Mercedes se fue,
para que sus canciones de cuna
se transformen en canciones de amor,
en rimas llenas de paz.
Como Mercedes no pudo conocer…
Jamás!

- PAT -

sábado, 26 de setembro de 2009

Ventos



Já nem sei quando sejam madrugadas
- ou dias plenos, de um viver ardente...
Pois pelas minhas mais sutis estradas,
um vento aflito busca-te, imprudente!

Cavalga amaro e nas fundas passadas,
lacera os sonhos da espera silente.
Espera antiga, de vidas passadas,
que não permite o agora em meu presente.

Cavalga o vento, dia ou madrugada...
E tem-me a vida, morta, devastada,
cativa eterna de um existir tão só...

Duma promessa, por ti, imolada...
Vento cortante, que esta alma cansada,
sopra ferino... E me reduz a pó!

- Patricia Neme -

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Primavera


(Photography by Fernando Campanella)

Ouro flutuando
pelos ramos desfolhados
nos ipês floridos.

Delores Pires

MUDANÇA




Cheia de neblina
a cidade, em verdade,
foge da rotina.


Delores Pires
em "O Livro dos Haicais"
(Crisiúma-SC)

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Ano de 2.010!



A todos amigos e visitantes do blogger,
desejo um ANO NOVO pleno de alegrias,
muita Paz, Saúde e Realizações.
Feliz, Ano Novo Cristão, de 2.010!

Maria Madalena

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Prece



dá-me a lucidez das
correntezas para que eu descubra
entre as tristezas que se
avolumam algum
sorriso mesmo
que não seja para mim

dá-me a serenidade de uma
estrela para que eu imagine
entre as lágrimas que não
me deixam qualquer
paz ainda
que breve

dá-me a claridade das
luas cheias para que eu invente
entre as angústias que se esparramam um
horizonte mesmo
que se transmude em ilusão

dá-me a esperança das
árvores para que eu teça
entre as ausências que se
imensificam uma sanidade ainda
que estofada de
delírios


Adair Carvalhais Júnior
(Minas Gerais)

domingo, 27 de dezembro de 2009

Eu e Ela



Não tenho intimidade mais
com a minha solidão,
estamos há longo tempo
distantes um do outro,
mas como velhos amigos
eu e ela sabemos
que nos queremos demais.

Não tenho mais tempo
assim busco no tempo
novas companhias
em desvario
de novos momentos
ou a calma de um
suave encontro,
preciso ganhar
todas as horas.

A solidão,
ela me espera,
com ela algum tempo
terei para recordar
minha vida de quimeras,
eu e ela.

Luiz Alberto dos Santos Monjeló
(R.G. do Sul)

domingo, 20 de dezembro de 2009

AS LUZES



Descolorindo a tarde
Abrindo as portas da noite
E liberando as estrelas em rebanhos líquidos
De luzes.

Não posso olhar sem impregnar
As lembranças de fotografias e imagens
Retorcidas, no aço das lâmpadas
Nas ácidas incursões da estante
De livros quando a lâmpada se ascende
Ascende-se um fio de sonhos e uma coberta de imaginações

As páginas dão conta dos fatos que em vão vivemos, que deveríamos ter posto a prova.
As palavras não ditas inclinam aos olhos cansados, uma multidão de imagens baças em
prontidão com os elementos invisíveis que infestam as nossas cansadas pálpebras...

A pequena estrela
É a porta e a chave
Para as pequenas
E infinitas coisas
Que juntamos
Que perdemos
Ao nos olhar
sem pressa, para a vasta planície deserta do espelho.

Não há uma formula para o desconhecido
O secreto que há em cada palavra
Ativa o homem que se esconde a cada página virada.

Georgio Rios
(Bahia)

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

As Horas



As Horas cismam no ar parado:
— Passado.
As Horas bailam no ar fremente:
— Presente.

As Horas sonham no ar obscuro:
— Futuro.


Da Costa e Silva
(1885-1950)

Diálogo Interior...



Ante o infinito,
Cismo e medito.
Mas vou pensando
E interrogando.

Dialogo a esmo
Comigo mesmo.

— Tudo convida
A amar a vida.

— E amar se deve
A um bem tão breve?

A vida é bela
No que revela...

— Mas como existe
O homem tão triste?

— A vida é a luta
Divina e bruta.

— Onde o heroísmo:
Páramo ou abismo?

— A vida encerra
Os bens da terra.

— Se esses dons temos,
Por que sofremos?

— A vida inquieta
É a mais completa.

— Mas por que a alma
Aspira à calma?

— A vida é intensa
Para quem pensa.

— E onde a esperança,
Que não descansa?

— A vida é pura
Quando há ventura.

— E por que sinto
A ânsia do instinto?

— A vida é chama,
Que apura e inflama.

— Por que a resumo
Em névoa e fumo?

— A vida é a glória
Sempre ilusória.

— Mas como é insano
O sonho humano?

— A eterna esfinge
Ninguém atinge...

— Que reticências
Nas existências!


Da Costa e Silva
(Piauí -1885-1950)

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

'PRIMAVERA I'



Verei a primavera se encaminhar com o seu chapéu de
palha e o seu róseo vestido
Pelas ruas amigas, perto da casa em que mora.
Verei o teu rosto se tingir com a poeira dos ocasos
E tuas mãos morenas se balançarem tênues sob a água das cascatas
Longe das ingratidões, das lutas, dos equívocos de todo dia.
Os cisnes se confiarão como nos tempos calmos.
As violetas distantes sorrirão com as terras úmidas e grávidas.
Os pássaros, os ninhos vão cantar!
Verei chegar o teu vestido e te confundirei com a Primavera.
Seguirei com a Primavera pelas ruas.
Os circos vão pousar como pássaros enormes.
Primavera! Primavera!
O amor vai renascer nos campos
E as amadas dormirão cobertas pelos azuis sem fim.


Augusto Frederico Schmidt
In: Um século de poesia
(Rio de Janeiro-1906-1965)

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

AS FLORES ESTÃO CHORANDO


Os lilases murcharam . . . As roseiras,
Ao castigo do outono, estão despidas . . .
Hão de viver assim horas inteiras,
Mergulhadas nas sombras esquecidas . . .

Outrora foram elas mensageiras
Das alegres paisagens coloridas . . .
Hoje ostentam nas hastes agoureiras.
A tristeza das rosas fenecidas . . .

Desce a noite orvalhada sobre os mirtos,
A secura das plantas abrandando
Na frouxidão letal dos cravos hirtos!

Enquanto o orvalho se transforma em bolhas
Que pelos ramos murchos vão rolando
Como se fossem lágrimas das folhas! . . .

Miguel Jansen Filho
(Paraíba 1925/1994)

'MADRUGADA EM MEU JARDIM '


Um divino clarão vem do nascente
E sobre o meu jardim calmo resvala!
Na graça deste quadro reluzente,
A aragem fria os meus rosais embala!

Tudo desperta misteriosamente!
E a luz cresce e se expande em doce escala,
Avivando o Iençol resplandescente
Da brancura dos lírios cor de opala!

E o sol, doirando as franjas do horizonte,
Celebra a missa do romper da aurora
Na doce Eucaristia do levante!

Da passarada escuta-se o clarim !
E a madrugada estende-se sonora,
Na aleluia de luz do meu jardim !

Miguel Jansen Filho
(Paraíba 1925/1994)

SONETO SEM NADA


Um grande sonho que nunca sonhei,
uma outra vida que nunca vivi,
um longo choro que nunca chorei,
um bom sorriso que nunca sorri,

um juramento que nunca jurei,
uma mentira que nunca menti,
uma ansiedade por que nunca ansiei,
um fingimento que nunca fingi,

uma lembrança que nunca lembrei,
uma descrença em que nunca descri,
uma esperança que nunca esperei,

um sentimento que nunca senti,
um pensamento que nunca pensei,
um sofrimento que sempre sofri.

Guilherme de Almeida
In: Os Sonetos

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Predileção



Amo os gestos estáticos, plasmados
numa atitude lenta de abandono;
certos olhares bêbedos de sono
e a poesia dos muros desbotados...

Amo as nuvens longínquas... o reflexo
na água dos foscos lampiões...as pontes...
a sufocação ríspida das fontes
e as palavras poéticas sem nexo.

Mas, sobretudo, eu amo esses instantes
em que, como dois presos foragidos,
os meus olhos se embrenham, distraídos,
na natureza - como dois amantes...


Onestaldo de Pennafort -
em Poesias
(Rio De Janeiro-1902-1987)

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Reflexões



Um barco passa ao longe
Na linha do horizonte.

Passa o tempo,
uma alegria, alguns sorrisos
Muitos sonhos, algumas dores
Muitos amores, poucas verdades

Um adeus,
algumas lágrimas, recordações
como no horizonte ao pôr-do-sol
Vão se esfumando as lembranças

Que importa se desce a sombra
Se tudo já é passado.
Navega comigo,
Até que a noite desapareça.

Ana Carlini

sábado, 28 de novembro de 2009

AS COLEÇÕES



Em primeiro lugar as magnólias.
Com seus cálices
e corolas: aquarelas
de todas as tonalidades e suma
delicadeza do toque.
Pequena aurora diluída
com doçura, nos tanques.


Depois a musica: frêmito
e susto de passaro.
As valsas – que sorrateiras. E as flautas.
As noites com flauta sob a janela
inaugurando a lua nascida
para o suspirado amor.


Mais tarde os campos, as grutas,
a maravilha. E o caos.
Com seus favos e suas hidras,
o mundo. O mar com seus apelos,
horizontes para o éter,
desespero em mergulho.


Com o tempo, o ocaso. As lentas
plumas, os reposteiros
com seus moucos ouvidos,
a tíbia madeira para
o resguardo das cinzas,
as entabulações – e com que recuos –
da paz.


Finalmente os endurecidos espelhos,
os cristais sob o quebra-luz,
dos ângulos o verniz,
o ouro com parcimônia, a prata,
o marfim com seus esqueletos.


Henriqueta Lisboa
In:'A Flor da Morte' (1945-1949)

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

"SALMO DO SILÊNCIO"



Tão grande é meu silêncio que ouviria
uma hóstia pousar sobre uma nuvem ,
a floração de estrelas no abismo
e o murmúrio de Deus amando o mundo.


Neste convulso silêncio escutaria
uma luz caminhando no infinito
e a tristeza de um anjo abandonado.


Tão puro meu silêncio que escuto
o solitário coração de Deus
fluindo angústia. E às vezes sinto
desdobrar-se em silêncio e mais silêncio
a grande voz a murmurar meu nome
na negra solidão inacessível.


Yttérbio Homem de Siqueira
de "Abismo Intacto"
(1932-1981-RG do Norte)

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

ÁRIA PARA VIOLINO


Para nadar no silêncio
ergo as mãos extraviadas;

são estrelas acordadas,
ou meu eco em seu silêncio.

Escorre pelo que sinto
meu perfil escrito e ouvido

e em som e cor divido
entre mim e o que não sinto.

Colombo de Souza
in:Estágio
(Curitiba-1920)

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

O EXÍLIO



(da terceira Rosa do Oriente)

Insensato destino, ao roubar-me a ventura,
de ser rosa nos campos do meu florescer.
De furtar-me os mistérios da extrema doçura,
que um profano cultivo não sabe antever.

Exilada a um terreno deserto, de agrura...
O esplendor do meu ser faz, em mim, fenecer!
No mosaico de um chão, sem calor, sem ternura,
me retorno aprendiz... Não mais quero viver!

Jogo ao vento os retalhos banhados de orvalho,
guardo o verde florir e em negror me agasalho...
Dantes, se rosa fui... Hoje sou flor qualquer.

Pois quem foi meu poeta, ficou tão distante...
Pereceu na perfídia do agora inconstante...
E da rosa não resta o perfume, sequer!


- Sarai Jahwel -

'TERCEIRA ROSA DO ORIENTE'



Ô, insensatez humana convencer as rosas
de que das rosas todo o tema se esgotou!
Quantos mistérios há nas faces luminosas
das rosas da manhã que ainda não raiou...

As rosas são dotadas de almas poderosas
que o escultor das primaveras reinventou
num paradoxo de impressões prodigiosas
tal retocar a flor que Deus não terminou.

Eu canto as rosas que replanto no jardim
as desfolhadas pelas frias mãos do vento
que feneceram de ser uma flor qualquer.

Eu canto a rosa do último poeta em mim
a que folheia o livro do meu pensamento
e sangra por amor no ventre da mulher!


Afonso Estebanez

'A CARAVANA'



(resposta à Primeira Rosa do Oriente)


Eu sinto o vento a encobrir os passos
da caravana, rumo ao ocidente;
rompe, em seu curso, milenares laços...
Mata o passado... E o amor nele existente.

Desertos, vales... Todos os espaços,
são ocultados num cantar plangente...
Canto que embala a rosa, em sonhos baços...
Outros jardins... Não mais o sol nascente.

E há tanta dor nos braços da partida...
Tanta ventura feita vã, perdida...
Como olvidar sentir tamanho, assim?

Onde o refúgio do porto altaneiro,
das ternas mãos do amado jardineiro...
Senhor, responde: o que será de mim?


- Sarai Jahwel –

'PRIMEIRA ROSA DO ORIENTE'



Há milênios construo entre ternuras
uma estrada de rosas que inauguras
em cada amanhecer de minha vida...

Assim, então, jamais sequei deserto
eis do teu sonho nunca me desperto
a não te ver ausente e adormecida...

Do Oriente ao Ocidente teu perfume
foi sempre a via etérea afeita e afim:
ao teu destino de ser meu queixume
em meus destinos de ser teu jardim.

Jardim da aurora que me fez a lume
lume da rosa de teu ventre em mim:
Rosa do Oriente que o amor resume
no amor das rosas com amor assim!


Afonso Estebanez

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

'A ROSA SE DESNUDA'



(uma resposta à Segunda Rosa do Oriente)


Não há no tempo a poção de magia,
que traga à rosa o seu primeiro encanto.
Foi-se-lhe a vida... Jaz em agonia,
por não mais ter a voz do próprio canto.

A primavera... Deus, que nostalgia...
Que padecer, que dor... É tanto o pranto...
Onde as sementes? Rosa tão vazia...
Rosa desnuda de cor e acalanto!

Misericórdia, céus, ouve-me a prece,
todo o esplendor da rosa, em mim, fenece...
E o desespero é qual o mar... Crescente.

É lua plena, de paixão e sangue...
É rosa morta, de tristeza, exangue...
Buscando as sendas do Grande Oriente.


- Sarai Jahwel -

'SEGUNDA ROSA DO ORIENTE'



Não vejo o dia de chegar o tempo
em que de rosas seja toda espera
como nos dias em que fico atento
e invento rosas para a primavera.

Não há deleites a não ser o alento
de ver o tempo regressar com ela
da doce esfera do contentamento
ao venturoso amor que regenera.

O amor da rosa que virá semente
do meu jardim secreto do oriente
para os canteiros rústicos do mar.

Talvez a vida seja o mar de rosas
que a despeito das vias arenosas
não se ferem nas pedras do luar.


Afonso Estebanez

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Forma de luz



A luz quando desvenda a vida
cria formas, alastra quem informa
devora males e cria forma

Verdeja sonhos num mar perdido
tal andarilho esvoaçante
de harmonias raras

Cinge minha alma como carícia,
serena e renovada
encerrando desacertos e desconsolos
pois tudo acaba ao se desprender
nas dúvidas de algumas reticências...

Conceição Bentes
Publicado no Recanto das Letras em 25/10/09
Código do Texto: T1886632

SOMBRA



A tarde entrou pela janela, como um hálito.
Na transparência do ar, que tem cheiro de mato,
Uma andorinha passa perdida, voa sem pressa.


No espelho imóvel dos brejos
A água prolonga o céu e uma primeira estrela.
O crepúsculo vem vindo, desce dos morros.


Não tarda, o véu sutil feito de cinza esparsa
Todo me envolvera em sua grande sombra
E outras estrelas brilharão na água dos brejos.



Ribeiro Couto
In: Melhores Poemas
(São Paulo- 1898-1963)

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

ROSA ENLUARADA



A rosa vermelha,
fresca e orvalhada,
sobre o teclado frio,
inerte, pousada
diz mais que muito.

A rosa vermelha,
tenra e molhada,
sobre o teclado cria
e verte o dito quieto.

A rosa vermelha,
infante e felina,
sobre o teclado ousa
dizer mais que muito.

A rosa vermelha,
invade meus olhos.
Nada teme: inteira sua;
é lua nua em íntimo culto.


Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"

LUAS BRANCAS



O medo de te perder
é o medo de me encontrar
- e trevo silente
ao sem-eira do vento
ao remoinho das brancas luas
retornar

Síndrome das crateras vagas
das horas nuas.

( Ai do estéril ventre
de toda antiga ausência
da sombra das palavras tuas.)


Fernando Campanella,
DE 'O EU CONFESSO'

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Do meu outono



O outono vai chegar... Neva a névoa do outono...
Perdem-se astros sem luz... Anda em choro a folhagem...
Há desesperos silenciosos de abandono...


O outono vai chegar... Neva a névoa do outono...
E eu sofro a angustia irremediável da paisagem...


O outono vai chegar... O outono vem tão cedo!
Irão morrer flores e estrelas, como as crianças
Tristes e mudas, que impressionam, fazem medo?


O outono vai chegar... Têm vozes do passado
As horas loiras, a cantarem vagarosas,
Com ressonâncias de convento abandonado...


Vozes de sonho, vozes lentas, do passado,
Falando coisas nebulosas, nebulosas...


O outono vai chegar, como um poeta descrente
Que funerais desilusórios acompanha...


O outono vai chegar... Neva a névoa do outono...
Perdem-se astros sem luz... Anda em choro a folhagem...
Há desesperos silenciosos de abandono...


O outono vai chegar... Neva a nevoa do outono...
E eu sofro a angustia irremediável da paisagem...



Cecília Meireles
In: Baladas para El-Rei (1925)

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Não há razão nem tempo



não há razão nem tempo em ser amada
enquanto as tardes desfizerem a vida
e no sono desvirtuem-se as manhãs
não há canto na melancolia
no quanto hesite a palavra luz
mas quando não houver segredo
e nem ruído que rasure a madrugada
se a verdade amordaçada
respirar
e de teus dedos escorrerem prantos
pelos anos de nunca e mais e tantos
tu te morrerás
e eu deixando enfim a nódoa
transparente
libertarei a aurora ao tom
da tempestade
e deixarei que me inunde
a paz

Lilia Silvestre Chaves
in 'E todas as orquestras acenderam a lua'
(Belém do Pará - 1951)

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Contigo



nas brumas do escuro mar
ou nas areias frias de um deserto
num breve segundo, a eternidade
nas tristes sombras da saudade
impensada dor da minha treva

depois, de tão cansada caminhada
de solitária dor, alma sofrida
pelos caminhos rudes desta lida
contigo, em meus braços, minha vida,
...impensada luz da minha treva


reginahelena
(sem verbo)

domingo, 8 de novembro de 2009

Flores no caminho



Há flores no caminho
não ando sozinho
Camélia, margaridas, sempre-vivas
rosas sem espinho
semeadas com carinho

No caminho há flores
em meu coração muitos amores

Há flores no caminho
em cada estação um ninho
nos lábios, o paladar do vinho
no leito, a seda e o linho
nas memórias, o frescor do pinho

Certamente há flores no caminho...


Úrsula Avner
(Minas Gerais)
Poema do site da autora; 'A alma da poesia"

sábado, 7 de novembro de 2009

POEMA DA SOLIDÃO



Cada dia que passa, cada dia
que me leva um anseio e que me traz
uma fadiga para o coração,
sinto mais o perfume de poesia,
o êxtase lívido, a pureza e a paz
da minha solidão.

Depois das noites carpideiras,
quando um queimor de lagrimas enxutas
punha goivos na cova das olheiras,
ai! quantas vezes me internei nas grutas
para esconder as faces!
E tive sempre alguém que me guardasse
a entrada como um cão:
minha bravia solidão.

Nos sonhos claros de felicidade,
quando quis estar só para a esperança
de sorrir e viver,
nem mesmo por piedade
me disse que o sorriso também cansa,

nunca toldou de leve o meu prazer
porque sabia que era tudo em vão,
minha profunda solidão.

Nas horas doentes de mormaço,
quando o jardim já deu todas as flores
e as aranhas do tédio, passo a passo,
enchem de teia os templos interiores,
e se pergunta à vida por que é bela,
tenho o consolo da meditação
ao sentir a alma como um barco à vela
no oceano da solidão.

Quando o vulto da morte, sonolento,
pousar à flor da terra essa bandeira
que ergo às nuvens na mão,
- calma, no orgulho do desprendimento,
minha palavra derradeira
quero dizê-la à solidão.



Henriqueta Lisboa
In: Melhores Poemas
De Velário (1930-1935)
(Minas Gerais 1901-1985)

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

ÂNSIA VERTIGINOSA


Forças que me levais por sobre o Oceano,
Para as fluidas regiões incompreendidas,
Onde se transfigura o ser humano
Na essência misteriosa de outras vidas,


Dai-me, como sabor do ultimo engano,
Neste mundo de graças desmentidas,
A ilusão de sentir-me sobre-humano,
Por estas amplidões indefinidas . . .


Na orgia, aqui, do Sol e das distancias,
Sonho, sentindo uma revoada de ânsias,
Ser chama – asa das ultimas vertigens –


Para, no ar, difundir-me em claridade
E, como o dia – espasmo das origens –
Fecundar de meu ser a Imensidade!



Luis Carlos
In: Amplidão

O SOM DAS ÁGUAS DOCES



Fazer feito o fiel verdureiro:
equilibrar nos ombros largos
dois cestos; ambulante resoluto -
presença diária no pequeno mundo
da enorme fome dos homens simples.

Conferir, compete ao aventureiro:
cada conta pendurar no avental
de quantos aventam saltar,
de inteiro corpo, na tempestade
da afoita vida dos homens simples.

Atentar, cabe àqueles que expiam
tantas perdas; que sonham oceanos
de inéditos pecados ao pé do altar.
Do profano ao sagrado, cabe àqueles
espionar a fantasia dos homens simples.

Avançar, confere venturas a quantos,
atrevidos, gravam nos seixos dos rios
o inominável, o índigo, o quieto Quasar,
e o som dos espíritos das águas doces -
que banha a vida dos homens simples.


Jairo De Britto,
em “Dunas de Marfim”

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

d' água que brota na fonte do ser



vou saciar a sede eterna
cantar com a chuva mansa
cambiar sentimentos
tudo que ilumina o sorriso criança

serei as asas
orvalhadas
nas águas cristalinas de suas retinas
gritarei seu nome ao infinito
completar o nada
com o brilho do amanhecer


José Geraldo Neres
(São Paulo)

domingo, 25 de outubro de 2009

"Púrpuras"



Na púrpura do Verso o outro do Sonho ardente,
Fio a fio, teci. Era manhã! Radiava
Em pleno azul meu belo sol adolescente.
E o meu Sonho, a essa luz, resplendia e cantava.

Como a enrediça, a vida, indomada e ascendente,
Por minha mocidade em mil voltas serpeava.
E tudo, no esplendor de um mundo renascente,
Sonoro, multicor, multímodo, vibrava.

Musa, que não gemeu flébil, magoada e langue:
Vivaz, tonto de luz, salta o primeiro verso,
Ao primeiro rebate estuoso do meu sangue.

Ó seivas tropicais! Ó sonoras luxúrias!
Mundo excelso do Sonho, esvoaçando, disperso,
No incontentado ardor dessas rimas purpúreas!


Arthur de Salles
In: ""Sete tons de uma poesia maior "
Uma leitura de Arthur Sales –Cláudio Veiga- Edt. Record 1984

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

ERMO ABSOLUTO



Desiludido da clemência humana,
Para a minha agonia de viver;
Arrastando comigo a caravana
Dos fantasmas que surgem do meu ser,


Busquei a solidão que nunca engana,
Onde, vendo-me virgem do prazer,
A poesia se fez Samaritana,
Para o azul da Amplidão dar-me a beber.


Mas, si eu, antigamente, era tristonho,
Agora, pelo Espaço, em pleno sonho,
Somente, acho extensão para os meus ais!


Somente, ébrio de abismos, quando grito,
Responde-me dos ermos do Infinito,
O silencio das cousas imortais.


Luis Carlos
In: Amplidão
(Rio de Janeiro- 1880-1932)
Membro da ABL

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

ALBA



Não faz mal que amanheça devagar,
as flores não têm pressa nem os frutos:
sabem que a vagareza dos minutos
adoça mais o outono por chegar.
Portanto não faz mal que devagar
o dia vença a noite em seus redutos
do leste — o que nos cabe é ter enxutos
os olhos e a intenção de madrugar.


Geir Campos
in 'Cantigas de acordar mulher'

MORTE... VIDA...



Se existe um amanhã... Um "logo mais"...
Quem sabe, onde a certeza do momento?
Viver, morrer... É tudo tão fugaz...
Efêmero... Qual é o pensamento.

Se agora, aqui... Em breve o corpo jaz
em meio ao canto triste do lamento.
Os sonhos... São entregues ao jamais...
Os planos... Perdem-se em esquecimento.

O Agora é tua vida, teu instante,
traze bem junto a ti quem é distante,
quem dá sentido a tu'alma, ao teu amor.

Pois só o amor conduz à eternidade,
o mais... O mais é vão, tola vaidade,
que em si traz o vazio, angústia e dor!

- Patricia Neme -

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Trovas



Tudo muda... O tempo avança...
Vai-se a vida...O globo roda,
mas com lastros na esperança,
sonhar nunca sai de moda.

¨¨
Embelezo o meu viver
com sorriso, amor e empenho,
pra jamais vir a perder
os amigos que mantenho!

¨¨
Posso dizer que a esperança
Que a vida faz renascer,
É um mito que não se alcança,
Mas como ajuda a viver...


¨¨
''Como cultivo amizades
e sou bom agricultor,
irão escrever: "SAUDADES",
na campa aonde eu me for.''

Miguel Russowsky

(-21 de jundo de 1.923 + 03 de outubro de 2.009)
Nossas homenagens ao poeta recentemente falecido.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

É O MAR. . .



É o mar que permanece – é sempre o mar
das esperas, que acende
os olhos,
para no exausto coração deitar
o silencio das praias e das ondas
a lassidão; é o mar que permanece
e faz da solidão da criatura
a solidão da água
que a circunda.


Alphonsus de Guimaraens Filho
In: Antologia Poética

ANOITECER NA LAGOA



Os juncos flexíveis contemplam a noite chegar ocultando
o injusto reino dos homens – triste reino dos homens.
A grande sombra vai aos poucos se infiltrando, e com ela um
quase remorso,
a consciência de que tudo, ai de nós! podia ser mais belo.



Alphonsus de Guimaraens Filho
In: Antologia Poética

POEMA DE ANIVERSARIO



Foge o homem para o centro do deus que o persegue
e risca na própria pele a beleza da morte,
o provado desenho de uma infância, estas formas
que a minúcia do olhar recompõe na cegueira.


Já não sente os cavalos, nem recorda o que cerca
a sozinha indolência que revê no destino
de estar, rosto na relva, eterno e antigo, vindo
do sol sobre as clareiras para a limpa tristeza.


Segue os céus que repartem, entre o certo e o difuso,
o sonhar exilado do que breve lhe fica,
do que traz sobre os ombros, como achas, a vida,
só instante e distancia, pobre húmus sem uso.


E joga o ser chorado e o que foi (recolhido
na sobra do menino que lhe fala ao ouvido)
sobre o colo e o abandono do deus que flui, calado,
entre muros de cinza, solidão e cansaço.



Alberto da Costa e Silva
In: As Linhas da Mão (1978)
(São Paulo - 1931)

sábado, 10 de outubro de 2009

Além dos Sonhos



Vôo além dos sonhos,
no fictício azul
que a luz do horizonte deixa ver,
o ondulado da poeira morta
ante o suspiro de um lamento

Meus sonhos sem costuras,
elidem as palavras das arestas,
onde o silêncio especula
o palpável desalento

Estás além de tudo,
permaneces imponderável
nas hipotéticas estrelas,
ponto eqüidistante de partida e chegada,
passagem silenciosa do eterno sempre

Conceição Bentes
Publicado no Recanto das Letras em 03/10/09
Código do Texto: T1845477

Passagens



Poderia ter sentido
o perfume da vida
passando entre as flores
que se encantam,
dissimulando asperezas
nas pétalas umedecidas

Prenderia tua imagem
no acústico de uma sonata,
no calor do sol ressacado
de um verão

O vento em suas rajadas afiadas,
cortará a saudade insuportável,
falando do amor
como quem fala da sede,
da fome, da dor.

Conceição Bentes
06/10/09

CHUVA?



Do céu cinzento, chega a chuva fina...
Vem mansamente, quase em desalento.
E chove, chove... Nunca que termina...
É chuva d’água... Ou chove sofrimento?

A terra dorme sob a gris neblina,
o tempo para, já não canta o vento...
Nem leve sol, a vida descortina...
É chuva d’água, ou chuva de lamento?

E vão-se o dia, noite, madrugada...
E sempre a chuva, tão desalentada...
Minh’alma indaga às nuvens: até quando?

Até que exista paz, amor, verdade,
e todo humano viva a boa-vontade...
Não vês? Não chove... Deus está chorando!

- Patrícia Neme -

PAI NOSSO


(Tadeusz Makovsky-1882-1932)

- porque há crianças... -

Pai nosso, Pai de toda a criançada,
estás longe no céu, por qual razão?
Te assusta tanta vida aniquilada,
Te agride ver a infância sem ter pão?

Do céu, ouves a mãe desempregada,
que implora por Tua Graça e Compaixão,
pra que a família seja alimentada
e os filhos tenham teto e educação?

Escutas a menina que é estuprada,
gritando de terror, dor, solidão?
E o jovem, cuja vida é ameaçada,
pra que seja, do tráfico, avião?

Tens visto que há criança escravizada
e, por salário, só ganha um tostão?
E aquela, que a chuva deixa assustada,
pois teme vá ao chão seu barracão?

Pai nosso, tanta coisa está errada...
Falta respeito, falta proteção...
Deixa, um pouquinho só, Tua morada,
vem cá, os filhos Teus estão sem chão!

- Patrícia Neme -

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

VELHO TEMA



Na carícia de místico segredo
vivia humilde como flor na gruta,
quando, a medo,
deixei o meu refúgio e o alvo manto
de meu pranto,
para confiar-te a triste calma
de minha alma.
Enfeitei toda a casa de guirlandas
como um presépio, e tremulo te disse
coisas brandas,
querendo unir a sombra dos meus olhos
aos teus olhos,
nesse tímido amor que é a beleza
da tristeza.

Mas quando te conheci que criado havia
nas linhas do teu corpo a branca estátua
da poesia,
riste ... enquanto aos meus olhos rasos de água
pela mágoa
vagava alguém num barco pelas brumas:
o amor resignado entre a ironia
das espumas.

Miguel Reale
In: 'Poemas do Amor e do Tempo'

Mercedes Sosa


Mercedes Sosa- San Miguel de Tucumán, 9 de julho de 1935
— Buenos Aires, 4 de outubro de 2009)



Mercedes se fue al cielo,
cantar para estrellas
que alumbran los ensueños de poetas.
Mercedes,
que buscaba libertad…
Ahora es pájaro libre
en la eternidad.
Así era necesario.
El hombre común ya no oye
las voces del miedo o dolor
que vienen del vientre de la tierra.
Pero un poeta…
Ese si conoce
el sentido del brillo
que una estrella encierra.
Mercedes se fue,
para que sus canciones de cuna
se transformen en canciones de amor,
en rimas llenas de paz.
Como Mercedes no pudo conocer…
Jamás!

- PAT -

sábado, 26 de setembro de 2009

Ventos



Já nem sei quando sejam madrugadas
- ou dias plenos, de um viver ardente...
Pois pelas minhas mais sutis estradas,
um vento aflito busca-te, imprudente!

Cavalga amaro e nas fundas passadas,
lacera os sonhos da espera silente.
Espera antiga, de vidas passadas,
que não permite o agora em meu presente.

Cavalga o vento, dia ou madrugada...
E tem-me a vida, morta, devastada,
cativa eterna de um existir tão só...

Duma promessa, por ti, imolada...
Vento cortante, que esta alma cansada,
sopra ferino... E me reduz a pó!

- Patricia Neme -

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Primavera


(Photography by Fernando Campanella)

Ouro flutuando
pelos ramos desfolhados
nos ipês floridos.

Delores Pires

MUDANÇA




Cheia de neblina
a cidade, em verdade,
foge da rotina.


Delores Pires
em "O Livro dos Haicais"
(Crisiúma-SC)