Seja bem-vindo. Hoje é

sexta-feira, 29 de julho de 2011

EM SEDA

Por esta luz que me alumia
e me inventa em seda a estrada

entre a arte, alívio da memória,
e o mais trêmulo aceno do nada

- se com o mundo me acertei/me desavim,
já nem sei -

sou o que perdidamente
tomou rumo de mim.

(Fernando Campanella, 2010)

quinta-feira, 28 de julho de 2011

SMILE

Viver quando a vida é um mar de rosas,
onde voga o batel das ilusões,
oh quanto é bom viver!

Quando a falena de asas luminosas
— Amor — se abriga em nossos corações,
como é triste morrer!

Viver, quando o Ideal é um sonho findo,
e o presente — amarga realidade...
como é triste viver!

Quando a Crença e o Amor não se extinguindo,
e empunhamos a taça da Saudade...
oh quanto é bom morrer!

Rosalia Sandoval
(Alagoas)
Da revista: "O Lyrio", nº 18 e 19, abril e maio 1904, PE

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Intervalo

Às vezes,
Todas as dores de uma vida inteira
Gritam...

Às vezes,
Nas mãos, os gestos de perdão
Petrificam...

Às vezes,
As canções dos anjos
Emudecem...

Às vezes,
Os silêncios , numa praia derradeira
Desaguam...

Às vezes...
Só às vezes...

Vera Muniz

Rochas

Não me apresse.
Meus olhos embriagam-se
Na visão altiva das montanhas...


Não tenho pressa.
Meu corpo inteiro dança
No ritmo idílico da eternidade...


Componho, pedra a pedra,
O jardim onde meu coração habita.

Vera Muniz

quarta-feira, 13 de julho de 2011

ALEGRIA

Trêmula gota de orvalho
Presa na teia de aranha,
Rebrilhando como estrela.

Helena Kolody
In: Correnteza

CICLO

Do telhado, solitário,
Sempre, um corvo centenário
Observa o pátio da escola.

Há um século, vive cheio
De meninos em recreio. . .
Como a vida não varia!

Claras risadas amenas
E sempre os mesmos brinquedos.
Mudam os rostos apenas.

Helena Kolody
In: Correnteza

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Compensação

O pensamento vestido de imaginados
Surge como um gânglio enfartado
E movimenta o cérebro cansado
Pelas distância sem rumo.
No caminho pedras e abismos
Se agarram ao nosso corpo frágil
E nos levam para a paisagem eterna
Num céu onde não há fim.
O mundo é um grande olho que espia tudo
E ensina um sofrimento mudo.
A luz pode ser esperança ou desespero
No olhar do transeunte que jamais veremos.
Sabemos que todos seguem o mesmo rumo
Nos jardins plantados de ciprestes.

Adalgisa Nery in Erosão

quarta-feira, 6 de julho de 2011

TAL VEZ, O QUE BASTE SABER*


I
Não que eu saiba tanto assim,
ou que menos me importe saber:
Há quantos, exatos incríveis anos,
não tomo um copo de cólera?

II 
Não que me caiba aventar aqui,
quão mal me comporte ou sobreviva ali.              
Ou arguir: Qual a veríssima idade
das algas, estrelas, pedras - da Luz?

Vez que tantos diferem de mim,
em tanta alegria ou tão pouca sorte,
qual a estival infame verdade do Tempo?

III
Sei, talvez suficiente, da noite, das luas,
dos rios e vaidades; do distraído
conviver com a morte – severa amante,
pão nosso primo de cada dia.

Conheço suas mais íntimas, venais,
profundas entranhas; becos, vielas e ruas
E elas, todas, muito mais sabem de mim!

IV 
Sei, da madrugada, o estuário das manhas
- malditas e surdas; a densa voz de cada cidade:
A farsa inteira – crua, da servil tempestade
com que profana e abafa a viva manhã!

V
Do dia, mares, amor e sol, já soube
- e quis - mais.       
Hoje, bem pouco sei. Mas o que sei me basta.

É este parco, velho, provável falso saber
que alimenta meu viver.
(Amanhã será outra noite!)

*Jairo De Britto, em
"Dunas de Marfim"

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Chuva Interior


Quando saia de casa
percebeu que a chuva
soletrava
uma palavra sem nexo
na pedra da calçada.

Não percebeu
que percebia
que a chuva que chovia
não chovia
na rua por onde
andava.

Era a chuva
que trazia
de dentro de sua casa;
era a chuva
que molhava
o seu silêncio
molhado
na pedra que carregava.

Um silêncio
feito mina,
explosivo sem palavra,
quase um fio de conversa
no seu nexo de rotina
em cada esquina
que dobrava.

Fora de casa,
seco na calçada,
percebeu que percebia
no auge de sua raiva
que a chuva não mais chovia
nas águas que imaginava.

Mario Chamie
(1933-2011)

Mário Chamie *(Cajobi, 1 de abril de 1933 - São Paulo, 3 de julho de 2011) foi um poeta e crítico brasileiro. Era formado em Direito pela Universidade de São Paulo. Foi secretário municipal de Cultura de São Paulo e criou a Pinacoteca Municipal de São Paulo, o Museu da Cidade de São Paulo e o Centro Cultural São Paulo.
Com seu livro Lavra Lavra, de 1962, instaurou o "poema-práxis". Mário Chamie é um nome muito importante na história das vanguardas surgidas no final da década de 1950, como dissidente do concretismo e fundador da "poesia-práxis". Tem mais de 140 obras publicadas e traduzidas em 57 idiomas. Gilberto Freyre escreveu sobre Chamie: "A criatividade se apresenta tão dele e tão não somente dele que é como se palavras, ou relações entre palavras, nascessem com ele, como se fossem de todo inventadas".
Foi professor convidado a dar aulas e palestras em diversas universidades pelo mundo, como Harvard, onde deu aulas para o astro da música Jim Morrison, vocalista da banda The Doors, de quem guarda até hoje uma coleção de cartas que este lhe enviara. Chamie dava aulas na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), em São Paulo, e era locutor do programa 50 por 1, exibido pela Rede Record e apresentado por Álvaro Garnero.
Foi casado por muitos anos com a falecida Emilie Chamie, famosa por seus trabalhos gráficos de divulgação de peças publicitárias. Participou do Projeto da Academia Paulista de Letras (da qual foi membro) "Escritor na Escola", ministrando duas palestras sobre o ritmo da fala na poesia escrita, nos colégios EE. Prof. Narbal Fontes e EE. Dr. Octávio Mendes.
O poeta morreu em 3 de julho de 2011, no Hospital Oswaldo Cruz.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

EM SEDA

Por esta luz que me alumia
e me inventa em seda a estrada

entre a arte, alívio da memória,
e o mais trêmulo aceno do nada

- se com o mundo me acertei/me desavim,
já nem sei -

sou o que perdidamente
tomou rumo de mim.

(Fernando Campanella, 2010)

quinta-feira, 28 de julho de 2011

SMILE

Viver quando a vida é um mar de rosas,
onde voga o batel das ilusões,
oh quanto é bom viver!

Quando a falena de asas luminosas
— Amor — se abriga em nossos corações,
como é triste morrer!

Viver, quando o Ideal é um sonho findo,
e o presente — amarga realidade...
como é triste viver!

Quando a Crença e o Amor não se extinguindo,
e empunhamos a taça da Saudade...
oh quanto é bom morrer!

Rosalia Sandoval
(Alagoas)
Da revista: "O Lyrio", nº 18 e 19, abril e maio 1904, PE

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Intervalo

Às vezes,
Todas as dores de uma vida inteira
Gritam...

Às vezes,
Nas mãos, os gestos de perdão
Petrificam...

Às vezes,
As canções dos anjos
Emudecem...

Às vezes,
Os silêncios , numa praia derradeira
Desaguam...

Às vezes...
Só às vezes...

Vera Muniz

Rochas

Não me apresse.
Meus olhos embriagam-se
Na visão altiva das montanhas...


Não tenho pressa.
Meu corpo inteiro dança
No ritmo idílico da eternidade...


Componho, pedra a pedra,
O jardim onde meu coração habita.

Vera Muniz

quarta-feira, 13 de julho de 2011

ALEGRIA

Trêmula gota de orvalho
Presa na teia de aranha,
Rebrilhando como estrela.

Helena Kolody
In: Correnteza

CICLO

Do telhado, solitário,
Sempre, um corvo centenário
Observa o pátio da escola.

Há um século, vive cheio
De meninos em recreio. . .
Como a vida não varia!

Claras risadas amenas
E sempre os mesmos brinquedos.
Mudam os rostos apenas.

Helena Kolody
In: Correnteza

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Compensação

O pensamento vestido de imaginados
Surge como um gânglio enfartado
E movimenta o cérebro cansado
Pelas distância sem rumo.
No caminho pedras e abismos
Se agarram ao nosso corpo frágil
E nos levam para a paisagem eterna
Num céu onde não há fim.
O mundo é um grande olho que espia tudo
E ensina um sofrimento mudo.
A luz pode ser esperança ou desespero
No olhar do transeunte que jamais veremos.
Sabemos que todos seguem o mesmo rumo
Nos jardins plantados de ciprestes.

Adalgisa Nery in Erosão

quarta-feira, 6 de julho de 2011

TAL VEZ, O QUE BASTE SABER*


I
Não que eu saiba tanto assim,
ou que menos me importe saber:
Há quantos, exatos incríveis anos,
não tomo um copo de cólera?

II 
Não que me caiba aventar aqui,
quão mal me comporte ou sobreviva ali.              
Ou arguir: Qual a veríssima idade
das algas, estrelas, pedras - da Luz?

Vez que tantos diferem de mim,
em tanta alegria ou tão pouca sorte,
qual a estival infame verdade do Tempo?

III
Sei, talvez suficiente, da noite, das luas,
dos rios e vaidades; do distraído
conviver com a morte – severa amante,
pão nosso primo de cada dia.

Conheço suas mais íntimas, venais,
profundas entranhas; becos, vielas e ruas
E elas, todas, muito mais sabem de mim!

IV 
Sei, da madrugada, o estuário das manhas
- malditas e surdas; a densa voz de cada cidade:
A farsa inteira – crua, da servil tempestade
com que profana e abafa a viva manhã!

V
Do dia, mares, amor e sol, já soube
- e quis - mais.       
Hoje, bem pouco sei. Mas o que sei me basta.

É este parco, velho, provável falso saber
que alimenta meu viver.
(Amanhã será outra noite!)

*Jairo De Britto, em
"Dunas de Marfim"

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Chuva Interior


Quando saia de casa
percebeu que a chuva
soletrava
uma palavra sem nexo
na pedra da calçada.

Não percebeu
que percebia
que a chuva que chovia
não chovia
na rua por onde
andava.

Era a chuva
que trazia
de dentro de sua casa;
era a chuva
que molhava
o seu silêncio
molhado
na pedra que carregava.

Um silêncio
feito mina,
explosivo sem palavra,
quase um fio de conversa
no seu nexo de rotina
em cada esquina
que dobrava.

Fora de casa,
seco na calçada,
percebeu que percebia
no auge de sua raiva
que a chuva não mais chovia
nas águas que imaginava.

Mario Chamie
(1933-2011)

Mário Chamie *(Cajobi, 1 de abril de 1933 - São Paulo, 3 de julho de 2011) foi um poeta e crítico brasileiro. Era formado em Direito pela Universidade de São Paulo. Foi secretário municipal de Cultura de São Paulo e criou a Pinacoteca Municipal de São Paulo, o Museu da Cidade de São Paulo e o Centro Cultural São Paulo.
Com seu livro Lavra Lavra, de 1962, instaurou o "poema-práxis". Mário Chamie é um nome muito importante na história das vanguardas surgidas no final da década de 1950, como dissidente do concretismo e fundador da "poesia-práxis". Tem mais de 140 obras publicadas e traduzidas em 57 idiomas. Gilberto Freyre escreveu sobre Chamie: "A criatividade se apresenta tão dele e tão não somente dele que é como se palavras, ou relações entre palavras, nascessem com ele, como se fossem de todo inventadas".
Foi professor convidado a dar aulas e palestras em diversas universidades pelo mundo, como Harvard, onde deu aulas para o astro da música Jim Morrison, vocalista da banda The Doors, de quem guarda até hoje uma coleção de cartas que este lhe enviara. Chamie dava aulas na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), em São Paulo, e era locutor do programa 50 por 1, exibido pela Rede Record e apresentado por Álvaro Garnero.
Foi casado por muitos anos com a falecida Emilie Chamie, famosa por seus trabalhos gráficos de divulgação de peças publicitárias. Participou do Projeto da Academia Paulista de Letras (da qual foi membro) "Escritor na Escola", ministrando duas palestras sobre o ritmo da fala na poesia escrita, nos colégios EE. Prof. Narbal Fontes e EE. Dr. Octávio Mendes.
O poeta morreu em 3 de julho de 2011, no Hospital Oswaldo Cruz.