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quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
‘Interrogação’
Sozinho, sozinho, perdido na bruma.
Há vozes aflitas que sobem, que sobem.
Mas, sob a rajada ainda há barcos com velas
e há faróis que ninguém sabe de que terras são.
- Senhor, são os remos ou são as ondas o que dirige o meu barco?
Eu tenho as mãos cansadas
e o barco voa dentro da noite.
Emílio Moura
de Itinerário Poético
'INFÂNCIA'
Poema de Raul de Leoni
Ao menos uma vez em toda a vida
A Verdade passou pela alma de cada homem...
Passou muito alto, muito vaga, muito longe,
Como os fantasmas, que mal chegam, somem,
Passou em sombra, num vôo refletida
No espelho da água trêmula de um rio...
Sombra de um vôo na água trêmula: Verdade !
Passou uma só vez em toda a vida
E sempre dessa vez a alma dos homens
Estava distraída,
E não reconheceu na sombra desse vôo
A ave ideal que planava no alto azul...
Quando volveu os olhos para a altura
Ela já ia desaparecendo...
Dela nada ficou no olhar triste dos homens,
Nem a lembrança de seu vulto incerto...
Passou uma só vez em toda a vida !
Sombra de um vôo na água trêmula: Verdade !
E esse vôo,
Que nunca mais voltou no mesmo céu deserto,
Nem ao menos deixou a sombra dentro d`água...
Raul de Leoni
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
'À VONTADE'
Não seja por isto, noite.
Melhor é que desças com toda a tua treva.
As portas se fecharam, ninguém rompe os cadeados,
ninguém estende a chave, e tudo é isolamento.
Mas talvez a ferrugem tenha inutilizado todas as chaves
ou as fechaduras, como se diz habitualmente, se zangaram.
Não seja por isto, todavia.
Melhor é que desças,
imensa ave cega sobre os cegos telhados.
Que agora eu converso moveis hirtos nas salas desertas.
E ouço um canto de pássaro empalhado.
Que agora, se alguém chegasse,
me ouviria dizer nitidamente: “Natanael, o tresloucado.”
E Natanael não está presente, é apenas mais um morto num mundo todo de mortos.
Não seja por isto, noite.
O tempo se esfuma.
As cortinas se agitam
ao vento de outras noites.
Especialmente ao vento de outras noites de noivado.
De núpcias.
Não desta, que é como um corredor que não leva a nenhuma porta,
e dentro do qual nos entrechocamos perplexos e desfigurados.
Não desta que nos acicata e magoa com o seu frio que positivamente não é
daqueles que os vivos toleram,
que emerge de trevas ainda mais densas e crispadas.
Mas não seja por isto, noite.
Se até com os mortos é possível encontrar uma razão qualquer de entendimento,
pelo menos a discreta cumplicidade do silencio,
também contigo que te rompes e te destróis como a polpa de um fruto que apodrece,
também contigo que és como uma velha paralitica de xale negro e vestes esgarçadas,
que te quedas contemplando não se sabe que outra
e espectral cidade.
Não seja por isto, noite.
Melhor é que desças. Com toda a tua treva.
E entre nós – embora ressabiados e feridos – até que poderás ficar à vontade.
Pois de qualquer modo há em ti um frêmito de vôo informulado,
grande ave de asas cegas...
Somos teus, como sabes, todos te pertencemos, constrangidos embora.
Mas não seja por isto.
A casa é tua – como nestes domínios é habito dizer aos amigos –
e poderás ficar à vontade.
Alphonsus de Guimaraens Filho
In: Só a noite é que amanhece
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Alphonsus de Guimaraens Filho
domingo, 28 de novembro de 2010
SIM, EU TENTO*
Sim, eu quis escrever
um poema alegre.
...Sim, eu quis antever
um poema alegre.
Sim, eu quis até viver
um poema alegre.
Mas, a vida me impôs
uma tristeza imensa.
A vida me expôs
uma franqueza intensa.
Então, não havia escolha:
como a tristeza no bolso,
esmago a ausência insana.
Mas eu quis, sim, escrever
um poema alegre.
Apenas um, porque é preciso:
enquanto ainda sobrevivo.
*Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
sexta-feira, 19 de novembro de 2010
DESCONHECIDO
Sou o pensamento
O vento soprando forte
O barco da sorte
O sorriso da alegria
A força da magia
A dor do fraco
O segredo do forte
O medo da vida.
Guimarães Rosa
João Guimarães Rosa
Nasceu em Cordisburgo, 27 de junho de 1908 —
faleceu no Rio de Janeiro, 19 de novembro de 1967,
foi um médico, escritor e diplomata brasileiro.
Autor de contos e livros marcados pela presença do sertão como palco das ações. Sua obra ficou marcada pela linguagem inovadora, utilizando elementos de linguagem popular e regional, com fortes traços de narrativa falada. Tudo isso, unindo à sua erudição, permitiu a criação de inúmeros vocábulos a partir de arcaísmos e palavras populares, invenções e intervenções semânticas e sintáticas. É considerado por muitos críticos um dos maiores escritores brasileiros de todos os tempos, ao lado de Machado de Assis.
Solidão
Velha flauta geme e chora,
Ora temas melodiosos,
Ora acordes vigorosos,
Saudando a vinda da aurora.
Todos dormem muito embora
Aqueles sons tão chorosos
Vão morrendo, vagarosos,
Até ficarem de fora.
No horizonte, o sol se ensaia
Tornando belo o cenário,
Nesta manhã junto ao mar.
Como é linda a branca praia,
Por onde assim solitário
Estou desde o madrugar.
Santos, Outubro de 1949.
Ives Gandra
'VI' - Lindolf Bell _
Atravesso compêndios,
currículos, apostilas
de silêncio
e minha sombra pisada
por outra sombra
também feita de tudo
e nada
Atravesso simulacros
e arranco o lacre da palavra
Pois menor que meu sonho
não posso ser
atravesso o avesso
E meu barco de travessias
é a palavra terra
cercada de água por todos os lados
Pois menor que meu sonho
não posso ser
Estou do lado de lá da ilha
Aqui disponho de mim
e conheço meu próprio acesso
Aqui conheço a face inversa da luz
onde me extravio
e não cessarei jamais
Pois menor que meu sonho
não posso ser.
Lindolf Bell
In ‘Código das Águas’
Lindolf Bell nasceu na cidade de Timbó, Santa Catarina, no dia 02 de novembro de 1938, e veio a falecer aos 10 de dezembro de 1998, em Blumenau, Santa Catarina. Ainda criança sua mãe o alfabelizou em alemão. Nos anos seguintes estudou em sua terra natal e em 1953, iniciou o Curso Técnico em Contabilidade de Blumenau, que concluíu em 1955. De volta a Timbó, ao Exército. Fez o curso de Ciências Sociais na Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ mas não chegou a concluir. No ano seguinte, retorna a Timbó. Em 1962, iniciou seus estudos no Curso de Dramaturgia na Escola de Arte Dramática de São Paulo, no qual se formou em 1964.
terça-feira, 9 de novembro de 2010
COM PASSOS DE SONHOS*
(Primeiro Rascunho)
I
...Sobrevoando a floresta,
que acolhe e alimenta seus sonhos,
vislumbro curso e recursos do rio que,
de janeiro às águas de março,
acalentam os animais que povoam,
da minha menina esperta,
toda a fronte e fortes ombros.
II
Sobrepesando a festa,
descubro cobras e ursos,
paturis e gansos, garças e peixes
que habitam o lago à espreita
dos humores de águias e tigres:
que invadem o aquário secreto
da minha mulher, amante, sol, lua,
prima e vera cigana menina.
III
Tanto quanto tão pouco sei,
ela caminha sobre nuvens travessas.
Sobrenado e circundo sua íris, sua boca;
afago seus olhos e seios salgados.
IV
Insone e alerta, eu sei daquilo que poupa
e alimenta seus sonhos!
Então, devoro suas dálias,
dunas, fauna, cartas e cores avessas...
(Portanto, quando ela adormece,
eu Sou - e algo mais Sei!)
*Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
sábado, 6 de novembro de 2010
Levam o amanhecer
A miragem no caminho
quarta-feira, 3 de novembro de 2010
"XI"
Novembro lava a alma
e as flores do Guapuruvú
respingam na tarde.
Logo, a lua dá o ar da graça
e entre os galhos da árvore
amorosamente se enrosca.
O universo embala então a terra
e os pássaros
sonham abóbodas iluminadas.
F.Campanella
da série 'Efemérides'
Photo 'Guapuruvú' (Schizolobium parahyba)
by Fernando Campanela.
terça-feira, 26 de outubro de 2010
domingo, 24 de outubro de 2010
'ALMA'
quinta-feira, 21 de outubro de 2010
OLHOS D’ESPANHA
Mergulho em seus olhos
um amor de inteira argúcia:
medo, desespero, arte-ofícios.
Mergulho em seus olhos
um mar de nomes inéditos:
cometas, algas, êxtase, suicídios.
Mergulho em seus olhos
uma língua afiada em riste:
verbos, substantivos, pronomes;
oceanos de silêncio e silício.
Mergulho em seus olhos
arcanjos de nuvens e neve:
retalhos, letras, sussurros;
restos avessos da inútil paixão.
Submerso em seus olhos,
desnudo e descubro seu corpo:
então, sua beleza me resgata
do pântano das sobras e sombras.
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
terça-feira, 19 de outubro de 2010
TRAVESSURAS DO TEMPO
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Saudades
"X" da série Efemérides
segunda-feira, 11 de outubro de 2010
'SONHO'
Da tua branca e solitária ermida
Por caminhos de céu que a lua esmalta-
Desces –banhada dessa luz cobalta-
O linho d’asa abrindo sobre a vida.
Nada,teu passo calmo,sobre-salta
E quando a mágoa as almas intimida
Das ilusões,a turba renascida,
Em rondas espalha pela noite alta.
E a claridade que se faz é tanta
Que logo a terra fica cheia dessa
Sonora e estranha luz que alegra e canta.
E iluminada de um luar de outono
A alma feliz e impávida,atravessa
A vasta e longa escuridão do sono.
Mário Pederneiras
Rondas Noturnas-1.906
segunda-feira, 4 de outubro de 2010
Delores Pires
quinta-feira, 30 de setembro de 2010
Farra de cores
A Primavera se avizinha:
raízes e letras
exigem sua hora e tempo.
Caminho pelo jardim.
Espinhos do alfabeto,
Azaléias da alma insone.
Caminho entre seixos.
Busco o perfeito aquário,
Onze-horas e algas
orientam os peixes.
Pedras, nuvens e letras noir.
Tudo anuncia a Primavera:
discreta, Almíscar, esperta.
Em torno dos homens
entorna suas flores, perfume,
brisa, maresia e malícia.
Palavras azuis sobre o mar.
Sobre o marfim, música,
frases, orquídeas raras.
II
A Primavera caminha anônima
como homens e mulheres na rua,
afoita com tantas luas.
A Primavera espraia
graça entre samambaias,
escala buganvílias, assanha roseiras.
Espio, solene, sapos e flores;
espreito folhagens, livros antigos.
Refaço e traço veredas,
espelho versos contra o sol.
Entre seios de nuas mulheres,
abrigo meus olhos úmidos:
Vermelhos antúrios
em fins de madrugada.
Calculo frações primas e veras;
pernas, seios, trepadeiras e lírios.
Estrelas avessas da manhã,
casuarinas de sonhos.
III
A Primavera se avizinha:
enlouquece românticos e céticos,
com sua farra de cores;
seu derrame de felicidade.
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
raízes e letras
exigem sua hora e tempo.
Caminho pelo jardim.
Espinhos do alfabeto,
Azaléias da alma insone.
Caminho entre seixos.
Busco o perfeito aquário,
Onze-horas e algas
orientam os peixes.
Pedras, nuvens e letras noir.
Tudo anuncia a Primavera:
discreta, Almíscar, esperta.
Em torno dos homens
entorna suas flores, perfume,
brisa, maresia e malícia.
Palavras azuis sobre o mar.
Sobre o marfim, música,
frases, orquídeas raras.
II
A Primavera caminha anônima
como homens e mulheres na rua,
afoita com tantas luas.
A Primavera espraia
graça entre samambaias,
escala buganvílias, assanha roseiras.
Espio, solene, sapos e flores;
espreito folhagens, livros antigos.
Refaço e traço veredas,
espelho versos contra o sol.
Entre seios de nuas mulheres,
abrigo meus olhos úmidos:
Vermelhos antúrios
em fins de madrugada.
Calculo frações primas e veras;
pernas, seios, trepadeiras e lírios.
Estrelas avessas da manhã,
casuarinas de sonhos.
III
A Primavera se avizinha:
enlouquece românticos e céticos,
com sua farra de cores;
seu derrame de felicidade.
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
segunda-feira, 27 de setembro de 2010
CANÇÃO DO EXÍLIO
Alma,
Pássaro solitário,
Como é difícil abranger-te!
Nem sei como defender-te,
Incomensurável que és.
Num só crepúsculo,
Passeias todas as paisagens,
Visitas todas as terras,
E te recolhes triste
À morada que te serve
De cárcere...
Dantas Mota,*
De Planície dos Mortos (1945)
*Nascido em 22 de março de 1913, em Aiuruoca, cidade do Sul de Minas Gerais, a 370 quilômetros de Belo Horizonte, José Franklin Massena de Dantas Motta viveu mais de meio século dedicando-se à poesia e ao direito.
(1913-1974)
Pássaro solitário,
Como é difícil abranger-te!
Nem sei como defender-te,
Incomensurável que és.
Num só crepúsculo,
Passeias todas as paisagens,
Visitas todas as terras,
E te recolhes triste
À morada que te serve
De cárcere...
Dantas Mota,*
De Planície dos Mortos (1945)
*Nascido em 22 de março de 1913, em Aiuruoca, cidade do Sul de Minas Gerais, a 370 quilômetros de Belo Horizonte, José Franklin Massena de Dantas Motta viveu mais de meio século dedicando-se à poesia e ao direito.
(1913-1974)
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
MAIS UMA PRIMAVERA
Mais um ano de intensa labuta,
Nesta vida muito bem vivida.
Sem nunca fugir da disputa,
Com a cabeça sempre erguida.
Mais um ano de tristeza,
Resistindo para não fraquejar.
Rogando aos céus por firmeza,
Para com rigor suportar.
Mais um ano de alegria,
E muita paz no coração.
Desfrutando da primazia,
De viver com amor e emoção.
Obrigado Senhor com louvores,
Por me dardes os bens, meus afetos.
Glorificando-me a vida com amores,
Minhas mulheres, filhos e netos.
Eu vos agradeço Senhor nesta hora,
Por ser real, e não uma quimera.
A graça de estar aqui, e agora,
Vivendo mais uma primavera.
23/09/2010
R.S. Furtado.
(1942-Natal-RN)
Parabéns ao querido amigo e poeta Rosemildo Sales Furtado e seus filhos,
que hoje aniversariam, desejamos e eles muita saúde, paz, amor e realizações.
Visite o blog do poeta:
http://arteemoes.blogspot.com/
Nesta vida muito bem vivida.
Sem nunca fugir da disputa,
Com a cabeça sempre erguida.
Mais um ano de tristeza,
Resistindo para não fraquejar.
Rogando aos céus por firmeza,
Para com rigor suportar.
Mais um ano de alegria,
E muita paz no coração.
Desfrutando da primazia,
De viver com amor e emoção.
Obrigado Senhor com louvores,
Por me dardes os bens, meus afetos.
Glorificando-me a vida com amores,
Minhas mulheres, filhos e netos.
Eu vos agradeço Senhor nesta hora,
Por ser real, e não uma quimera.
A graça de estar aqui, e agora,
Vivendo mais uma primavera.
23/09/2010
R.S. Furtado.
(1942-Natal-RN)
Parabéns ao querido amigo e poeta Rosemildo Sales Furtado e seus filhos,
que hoje aniversariam, desejamos e eles muita saúde, paz, amor e realizações.
Visite o blog do poeta:
http://arteemoes.blogspot.com/
terça-feira, 21 de setembro de 2010
Primavera
Setembro entrou pela janela adentro,
com um puro frescor de primavera.
Inunda-se de luz toda a paisagem
e o meu canto transborda à tua espera.
A doçura da tarde é uma carícia.
Entreabrem-se flores docemente.
As nuvens estão nítidas e imóveis
no céu azul aberto à minha frente.
Há murmúrios e vozes pela rua.
Frescos risos distraem meus ouvidos
e ficam borbulhando como fonte
ou como choque de cristais partidos.
A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde.
como um rio fugindo de seu leito.
Minha pobre ternura ignorada,
minha heróica ternura impressentida,
teima em mostrar-se como a primavera,
pensa em tocar de leve a tua vida.
É difícil ser poeta e ser mulher.
É difícil cantar sem revelar.
Pode o poeta contar o seu segredo,
mas a mulher o seu deve guardar.
A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde,
como um rio fugindo de seu leito.
Fecharei a janela à primavera
e calarei o poeta nesta tarde,
para que o sonho em nada me perturbe,
nem meu canto transborde à tua espera.
Lila Ripoll
in Poemas e Canções.
com um puro frescor de primavera.
Inunda-se de luz toda a paisagem
e o meu canto transborda à tua espera.
A doçura da tarde é uma carícia.
Entreabrem-se flores docemente.
As nuvens estão nítidas e imóveis
no céu azul aberto à minha frente.
Há murmúrios e vozes pela rua.
Frescos risos distraem meus ouvidos
e ficam borbulhando como fonte
ou como choque de cristais partidos.
A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde.
como um rio fugindo de seu leito.
Minha pobre ternura ignorada,
minha heróica ternura impressentida,
teima em mostrar-se como a primavera,
pensa em tocar de leve a tua vida.
É difícil ser poeta e ser mulher.
É difícil cantar sem revelar.
Pode o poeta contar o seu segredo,
mas a mulher o seu deve guardar.
A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde,
como um rio fugindo de seu leito.
Fecharei a janela à primavera
e calarei o poeta nesta tarde,
para que o sonho em nada me perturbe,
nem meu canto transborde à tua espera.
Lila Ripoll
in Poemas e Canções.
segunda-feira, 20 de setembro de 2010
SONETO 4
O tempo é a gente – uma pessoa amiga
Com quem convido rumos a um novelo;
Pessoa longamente agora e antiga
Na esperança – retrato sem modelo.
Mas quando alguém se desenreda e morre
Em cada ponta a ponta que se escoa,
O tempo é como uma pessoa escorre
Da gente. E a gente nasce outra pessoa!
- “Alô espelho, aqui falando outrora
( Porque eu não disse não à tua espera? ).
Responde – quem morreu como quem era?”
É assim que o tempo desarruma –
Quatro pessoas, duas ou nenhuma?
Homero Frei
In: Interior do Tempo
sexta-feira, 17 de setembro de 2010
Pássaro e Mulher
Mulher e Pássaro
Chamar Pássaros
quinta-feira, 16 de setembro de 2010
"IX"
segunda-feira, 13 de setembro de 2010
MEU BARCO
Ele sempre chega,
quando meus sonhos canções
florescem verões.
Sempre parte,
quando lágrimas estrelas
escurecem meu poente.
Meu barco hoje,
só quero-o em brinquedo,
namorando em minhas águas. . .
. . . não quero vê-lo navegar!
. . . ilusões p’ra longe levar?
e talvez,
nunca mais voltar?
Alvina Tzovenos
In: Buscas de Infinitos
sexta-feira, 10 de setembro de 2010
'TÉDIO'
Tudo se acaba aos nossos olhos perto
Numa brancura que de ver nos cansa,
Como se então de névoas um deserto
Se abrisse assim sem luz nem esperança.
E nessa névoa que nos deixa incerto
E num abismo sem sentir nos lança,
Como se o olhar se visse então coberto
Sentimos se apagar nossa lembrança.
Sentimos um torpor indefinido,
Um vago sentimento adormecido
Como da morte as frias mãos felinas.
E nesse triste desalento infindo
De todo o céu sentimos ir fluindo
Neblinas e neblinas e neblinas...
Saturnino de Meireles
De Astros mortos (1903)
sábado, 28 de agosto de 2010
RESSONÂNCIA
Fico a ouvir cada som,
infindo ou fundo,
que me acata ou alcança.
Desconfio, mais e mais,
de cada um. Sem travas,
transam sem fim...
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
infindo ou fundo,
que me acata ou alcança.
Desconfio, mais e mais,
de cada um. Sem travas,
transam sem fim...
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
GOSTO DA LÍNGUA
domingo, 22 de agosto de 2010
SUPOSIÇÕES
I
Suponha que não sei
como a conheço.
Talvez assim
meus olhos amanheçam.
II
Suponha que não sei
do lado avesso.
Talvez assim
minhas mãos o reconheçam.
III
Suponha que não sei
o exato endereço.
Talvez assim
meus ouvidos o traduzam.
IV
Suponha que não sei
o claro caminho.
Talvez assim
minhas pernas me conduzam.
V
Suponha que não sei
do bravo carinho.
Talvez assim
minha boca o descubra em canto.
VI
Suponha que não sei
quando ou como atravessar o rio.
Talvez assim
aprenda a nadar enquanto.
VII
Suponha que nada sei
do amor, viver ou ser.
Talvez assim
meus pés me levem até você.
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
quinta-feira, 12 de agosto de 2010
'POESIS'
A poesia é algo assim
Como uma dúbia certeza,
Aposta de um tudo
No oco intraduzível do nada,
Algo como a luz-menina dos olhos
Entreabrindo a opacidade,
Sumo delicado
Espremido de alegrias
E enfermidade,
Efemérides
E ainda um certo milagre,
Pérola pescada -
Insípida borboleta dos dias
Pela magia do verbo eterno
Encantada.
(Fernando Campanella)
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
"Cantilena"
"Selvagem"
segunda-feira, 9 de agosto de 2010
Da Massa da Alma
XLVII
Tenho a alma feita de soluços
e dádivas sem recompensa
de matérias minerais sem substância
e substâncias sem matéria alguma.
Tenho a alma feita de piedade
da extensa e sobreposta que há no mundo
de destroços de geométricas ilusões
em verazes ferozes descampados.
Tenho a alma feita de meninos
e dos sonhos coloridos dos meninos
da aspiração (por fim) de não ser barro
mas as pedra que erige o tempo e o templo.
junho de 66
Álvaro Pacheco
In "Seleção de Poemas"(1984)
Memória
Deixar a memória
cumprir sua parte
juntar os pedaços
compor os seus itens
então reverter-se
do tempo e da carne
tornando-se apenas
um puro fluir
deixar que a memória
performe e execute
e sermos apenas
processing data
(e indeléveis registros).
Rio, outubro de 1972
Álvaro Pacheco
In "Seleção de Poemas"(1984)
Nascido em 26 de novembro de 1933, no Piauí, fez os seus primeiros estudos em Teresina, onde concluiu o Curso Ginasial, vindo para o Rio de Janeiro logo em seguida. No Colégio Salesiano Santa Rosa de Niterói fez o Curso Científico e formou-se em Direito em 1958 pela Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro. Exerceu a advocacia no Rio de 1957 a 1963.
Reside no Rio de Janeiro desde que saiu do Piauí. [set/1998]
domingo, 8 de agosto de 2010
SONETO AO TEMPO
Na areia, aonde o mar encerra em ondas seu curso,
Fico olhando o horizonte, a brisa é leve, suave,
Meus pensamentos voam, as nuvens brincam no céu,
Sinto a liberdade daquele momento breve, que me leva...
Em poucos instantes, a minha alma leve flutua, nua,
longe das angústias desta vida, de seres camuflados,
mascarados de sorrisos, de palavras sem sentido,
pois sou eu que faço minha sombra, meu castelo na areia.
Ainda de frente ao mar, as lembranças fazem sua dança,
bailam ao meu redor, feito bailarinas em um palco, giram,
entre sorrisos e lágrimas, surgem e como num encanto se vão...
Assim, as marcas do tempo, em minha memória, presentes,
dispersas seguem seu rumo, e fico com um sorriso leve,
Tempo que se foi, na brisa, nas nuvens, nas ondas...em mim.
(Reggina Moon)
quarta-feira, 4 de agosto de 2010
'Mar de solidão'
Aceito a solidão
da partida dos meus encantos,
na cadência monótona dos meus passos
anunciando auroras salpicadas
de orvalhos amargos das manhãs
Ventos errôneos das tardes,
regressam com roupagem cinza outonal,
sem semear fantasias,
convertendo a alma em ocasos
debruçados em seus tons de melodia
Ando sem pressa, sem lembranças
apenas o coração espera
entre o resto e o nada
de viagens profundas
nos desertos por onde passo.
Conceição Bentes
Publicado no Recanto das Letras em 04/08/10
Código do Texto: T2417359
sexta-feira, 30 de julho de 2010
Identificação
quinta-feira, 29 de julho de 2010
'Qietude'
Celebrar a cartase
suscetível dos pensamentos
ansiosos sejam de realizações
ou de frustrações .
Assim experimentar a
plenitude do absoluto
com o coração.
Filhos das estrelas
pulsando amor
no grande silêncio.
Pleno e vazio
banhado pela luz e paz,
na ausência do próximo
segmento frenético.
Manto de tranqüilidade.
Aharon
Nelson Aharon
Joenvile-SC
domingo, 25 de julho de 2010
'Deixa-me seguir para o mar'
Tenta esquecer-me...
Ser lembrado é como evocar
Um fantasma...
Deixa-me ser o que sou,
O que sempre fui, um rio que vai fluindo...
Em vão, em minhas margens cantarão as horas,
Me recamarei de estrelas como um manto real,
Me bordarei de nuvens e de asas,
Às vezes virão a mim as crianças banhar-se...
Um espelho não guarda as coisas refletidas!
E o meu destino é seguir... é seguir para o Mar,
As imagens perdendo no caminho...
Deixa-me fluir, passar, cantar...
Toda a tristeza dos rios
É não poder parar!
Mario Quintana
Baú de espantos,
Editora Globo, Rio de Janeiro, 1986
quarta-feira, 21 de julho de 2010
Rubis ao vento
ouvir ao vento,
ao virar vento
Ouvi de tua boca o silêncio, ansioso
de uma palavra hebraica, sem ânsia.
Andamos entre ruínas circulares
com Borges e alefes e golens...
descobrimo-nos nas solidões
tropicais, involuntariamente.
A palavra acumulada de nostalgia
do eco de um antigo deus ausente:
ecos divinos, arcaicos livros vivos.
Ouvi de tua boca o silêncio, ansioso.
São Paulo, Julho 1989
Vicente Cechelero
(Ascurra, SC, 13 de Janeiro de 1950 — Navegantes, SC, 16 de Abril de 2000)
segunda-feira, 19 de julho de 2010
VIDA
Não digas
que estás só
se nunca sentiste
a verdadeira solidão
porque algum dia
poderás te encontrar
dolorosamente só.
Não reclames
da tragicidade
da vida...
Envolto nos problemas
descobrirás
o sentido de viver.
Verás então
que a vida
é bem mais bela
do que pensas.
Não afirmes
eu não amo
sem que disso
tenhas certeza.
Quando amares
- previne-te -
sofrerás!
Não maldigas
a noite escura.
Ela será
o acalento
da tua Tristeza Maior.
Não abandones
a estrelinha singela.
Quando estiveres triste
verás ser a estrela
tua amiga.
Buscarás consolo
nela
e serás feliz...
Delores Pires
In a Estrela e a Busca
Poema recebido através da amiga Dione Coppi Eller,
de "Gotas de poesias e outras essências"
domingo, 18 de julho de 2010
Torna viagem
NOTURNO
Certa presença concreta da noite vem
insinua-se infiltra-se e entorpece
de serenidade ou angústia. Ou dupla
embala em sonho em acre e em silêncio
Vem materna e serena mas corpórea
e afaga o descanso e entoa a canção inatingível
Então se avoluma o esquecimento e envolve-me e avança
comigo nos braços para a distância e o sonho perfeito
Bandeira Tribuzi
In: Poesias Completas
Bandeira Tribuzi, pseudônimo de José Tribuzi Pinheiro Gomes,(São Luís, Maranhão, 2 de fevereiro de 1927 — 8 de setembro de 1977)
quinta-feira, 15 de julho de 2010
PAISAGEM POR DENTRO
Abro os braços
para a paisagem
descortinada janela a fora,
aos olhos que se arregalam.
E o coração:
- a vida é bela bebida aos poucos.
O verde enverdece o sol,
o amarelo traz fruta – esperança,
a saudade em chuva e orvalho
cai (dos tempos de criança).
Bate-me por dentro, nas laterais:
- as narinas sentem
e os ouvidos ouvem
o vento
e seus mistérios e eflúvios,
arrepiando a pele como tentáculos.
A alma que voava
me pousou
na beira do sonho.
Francisco Miguel de Moura
(Jenipapeiro,Piauí- 16 de junho de 1933)
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quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
‘Interrogação’
Sozinho, sozinho, perdido na bruma.
Há vozes aflitas que sobem, que sobem.
Mas, sob a rajada ainda há barcos com velas
e há faróis que ninguém sabe de que terras são.
- Senhor, são os remos ou são as ondas o que dirige o meu barco?
Eu tenho as mãos cansadas
e o barco voa dentro da noite.
Emílio Moura
de Itinerário Poético
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'INFÂNCIA'
Eu fui meu
como o espaço
era do pássaro.
Eu me soltava
em cantos e plumas
pelos campos da manhã.
Eu brincava comigo:
eu era eu
e o meu amigo.
Eu me falava baixo
para não espantar
o meu silêncio.
Eu era pequeno
e imenso.
Wilson Pereira
(Minas Gerais 1.949)
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Wilson Pereira
Poema de Raul de Leoni
Ao menos uma vez em toda a vida
A Verdade passou pela alma de cada homem...
Passou muito alto, muito vaga, muito longe,
Como os fantasmas, que mal chegam, somem,
Passou em sombra, num vôo refletida
No espelho da água trêmula de um rio...
Sombra de um vôo na água trêmula: Verdade !
Passou uma só vez em toda a vida
E sempre dessa vez a alma dos homens
Estava distraída,
E não reconheceu na sombra desse vôo
A ave ideal que planava no alto azul...
Quando volveu os olhos para a altura
Ela já ia desaparecendo...
Dela nada ficou no olhar triste dos homens,
Nem a lembrança de seu vulto incerto...
Passou uma só vez em toda a vida !
Sombra de um vôo na água trêmula: Verdade !
E esse vôo,
Que nunca mais voltou no mesmo céu deserto,
Nem ao menos deixou a sombra dentro d`água...
Raul de Leoni
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Raul de Leoni
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
'À VONTADE'
Não seja por isto, noite.
Melhor é que desças com toda a tua treva.
As portas se fecharam, ninguém rompe os cadeados,
ninguém estende a chave, e tudo é isolamento.
Mas talvez a ferrugem tenha inutilizado todas as chaves
ou as fechaduras, como se diz habitualmente, se zangaram.
Não seja por isto, todavia.
Melhor é que desças,
imensa ave cega sobre os cegos telhados.
Que agora eu converso moveis hirtos nas salas desertas.
E ouço um canto de pássaro empalhado.
Que agora, se alguém chegasse,
me ouviria dizer nitidamente: “Natanael, o tresloucado.”
E Natanael não está presente, é apenas mais um morto num mundo todo de mortos.
Não seja por isto, noite.
O tempo se esfuma.
As cortinas se agitam
ao vento de outras noites.
Especialmente ao vento de outras noites de noivado.
De núpcias.
Não desta, que é como um corredor que não leva a nenhuma porta,
e dentro do qual nos entrechocamos perplexos e desfigurados.
Não desta que nos acicata e magoa com o seu frio que positivamente não é
daqueles que os vivos toleram,
que emerge de trevas ainda mais densas e crispadas.
Mas não seja por isto, noite.
Se até com os mortos é possível encontrar uma razão qualquer de entendimento,
pelo menos a discreta cumplicidade do silencio,
também contigo que te rompes e te destróis como a polpa de um fruto que apodrece,
também contigo que és como uma velha paralitica de xale negro e vestes esgarçadas,
que te quedas contemplando não se sabe que outra
e espectral cidade.
Não seja por isto, noite.
Melhor é que desças. Com toda a tua treva.
E entre nós – embora ressabiados e feridos – até que poderás ficar à vontade.
Pois de qualquer modo há em ti um frêmito de vôo informulado,
grande ave de asas cegas...
Somos teus, como sabes, todos te pertencemos, constrangidos embora.
Mas não seja por isto.
A casa é tua – como nestes domínios é habito dizer aos amigos –
e poderás ficar à vontade.
Alphonsus de Guimaraens Filho
In: Só a noite é que amanhece
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Alphonsus de Guimaraens Filho
domingo, 28 de novembro de 2010
SIM, EU TENTO*
Sim, eu quis escrever
um poema alegre.
...Sim, eu quis antever
um poema alegre.
Sim, eu quis até viver
um poema alegre.
Mas, a vida me impôs
uma tristeza imensa.
A vida me expôs
uma franqueza intensa.
Então, não havia escolha:
como a tristeza no bolso,
esmago a ausência insana.
Mas eu quis, sim, escrever
um poema alegre.
Apenas um, porque é preciso:
enquanto ainda sobrevivo.
*Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
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Jairo De Britto
sexta-feira, 19 de novembro de 2010
DESCONHECIDO
Sou o pensamento
O vento soprando forte
O barco da sorte
O sorriso da alegria
A força da magia
A dor do fraco
O segredo do forte
O medo da vida.
Guimarães Rosa
João Guimarães Rosa
Nasceu em Cordisburgo, 27 de junho de 1908 —
faleceu no Rio de Janeiro, 19 de novembro de 1967,
foi um médico, escritor e diplomata brasileiro.
Autor de contos e livros marcados pela presença do sertão como palco das ações. Sua obra ficou marcada pela linguagem inovadora, utilizando elementos de linguagem popular e regional, com fortes traços de narrativa falada. Tudo isso, unindo à sua erudição, permitiu a criação de inúmeros vocábulos a partir de arcaísmos e palavras populares, invenções e intervenções semânticas e sintáticas. É considerado por muitos críticos um dos maiores escritores brasileiros de todos os tempos, ao lado de Machado de Assis.
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João Guimarães Rosa
Solidão
Velha flauta geme e chora,
Ora temas melodiosos,
Ora acordes vigorosos,
Saudando a vinda da aurora.
Todos dormem muito embora
Aqueles sons tão chorosos
Vão morrendo, vagarosos,
Até ficarem de fora.
No horizonte, o sol se ensaia
Tornando belo o cenário,
Nesta manhã junto ao mar.
Como é linda a branca praia,
Por onde assim solitário
Estou desde o madrugar.
Santos, Outubro de 1949.
Ives Gandra
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Ives Granda Martins
'VI' - Lindolf Bell _
Atravesso compêndios,
currículos, apostilas
de silêncio
e minha sombra pisada
por outra sombra
também feita de tudo
e nada
Atravesso simulacros
e arranco o lacre da palavra
Pois menor que meu sonho
não posso ser
atravesso o avesso
E meu barco de travessias
é a palavra terra
cercada de água por todos os lados
Pois menor que meu sonho
não posso ser
Estou do lado de lá da ilha
Aqui disponho de mim
e conheço meu próprio acesso
Aqui conheço a face inversa da luz
onde me extravio
e não cessarei jamais
Pois menor que meu sonho
não posso ser.
Lindolf Bell
In ‘Código das Águas’
Lindolf Bell nasceu na cidade de Timbó, Santa Catarina, no dia 02 de novembro de 1938, e veio a falecer aos 10 de dezembro de 1998, em Blumenau, Santa Catarina. Ainda criança sua mãe o alfabelizou em alemão. Nos anos seguintes estudou em sua terra natal e em 1953, iniciou o Curso Técnico em Contabilidade de Blumenau, que concluíu em 1955. De volta a Timbó, ao Exército. Fez o curso de Ciências Sociais na Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ mas não chegou a concluir. No ano seguinte, retorna a Timbó. Em 1962, iniciou seus estudos no Curso de Dramaturgia na Escola de Arte Dramática de São Paulo, no qual se formou em 1964.
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Lindolf Bell
terça-feira, 9 de novembro de 2010
COM PASSOS DE SONHOS*
(Primeiro Rascunho)
I
...Sobrevoando a floresta,
que acolhe e alimenta seus sonhos,
vislumbro curso e recursos do rio que,
de janeiro às águas de março,
acalentam os animais que povoam,
da minha menina esperta,
toda a fronte e fortes ombros.
II
Sobrepesando a festa,
descubro cobras e ursos,
paturis e gansos, garças e peixes
que habitam o lago à espreita
dos humores de águias e tigres:
que invadem o aquário secreto
da minha mulher, amante, sol, lua,
prima e vera cigana menina.
III
Tanto quanto tão pouco sei,
ela caminha sobre nuvens travessas.
Sobrenado e circundo sua íris, sua boca;
afago seus olhos e seios salgados.
IV
Insone e alerta, eu sei daquilo que poupa
e alimenta seus sonhos!
Então, devoro suas dálias,
dunas, fauna, cartas e cores avessas...
(Portanto, quando ela adormece,
eu Sou - e algo mais Sei!)
*Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
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Jairo De Britto
sábado, 6 de novembro de 2010
Levam o amanhecer
Partem.
E levam consigo a memória
de nosso amanhecer.
A quem dirigir
a pergunta mágica:
Lembra-se?
Quem,
entre os jovens,
acreditará
que fomos jovens também?
Helena Kolody
In: Poemas do Amor Impossível
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Helena Kolody
A miragem no caminho
Perdeu-se em nada,
caminhou sozinho,
a perseguir um grande sonho louco.
(E a felicidade
era aquele pouco
que desprezou ao longo do caminho).
Helena Kolody
In: Poemas do Amor Impossível
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Helena Kolody
quarta-feira, 3 de novembro de 2010
"XI"
Novembro lava a alma
e as flores do Guapuruvú
respingam na tarde.
Logo, a lua dá o ar da graça
e entre os galhos da árvore
amorosamente se enrosca.
O universo embala então a terra
e os pássaros
sonham abóbodas iluminadas.
F.Campanella
da série 'Efemérides'
Photo 'Guapuruvú' (Schizolobium parahyba)
by Fernando Campanela.
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Fernando Campanella
terça-feira, 26 de outubro de 2010
domingo, 24 de outubro de 2010
'ALMA'
Se eu pudesse fugir à planície da vida...
Como um arranha-céu de fronte de granito,
Iria projetar uma estrutura de aço
Para a cintilação remota das estrelas,
Para a serenidade inefável do espaço.
(1977)
Helena Kolodi
em 'Correnteza'
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Helena Kolody
quinta-feira, 21 de outubro de 2010
OLHOS D’ESPANHA
Mergulho em seus olhos
um amor de inteira argúcia:
medo, desespero, arte-ofícios.
Mergulho em seus olhos
um mar de nomes inéditos:
cometas, algas, êxtase, suicídios.
Mergulho em seus olhos
uma língua afiada em riste:
verbos, substantivos, pronomes;
oceanos de silêncio e silício.
Mergulho em seus olhos
arcanjos de nuvens e neve:
retalhos, letras, sussurros;
restos avessos da inútil paixão.
Submerso em seus olhos,
desnudo e descubro seu corpo:
então, sua beleza me resgata
do pântano das sobras e sombras.
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
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Jairo De Britto
terça-feira, 19 de outubro de 2010
TRAVESSURAS DO TEMPO
Ronco
de trovões.
Coriscos
cruzam
a atmosfera.
Um clarão
morre
no além . . .
Vento
que balança
as arvores.
Pássaros
fugidios.
Pessoas
fogem
no tempo . . .
Delores Pires
In: A Estrela e a Busca
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Delores Pires
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Saudades
saudades não morrem, envelhecem
no peito
nas gavetas
nos baus... nas estantes...
as dores passam, as saudades ficam
no fundo da gente
em algum cantinho escondido
exalando aquele cheiro de musgo verde.
£una
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Mariza Alencastro
"X" da série Efemérides
(Caesalpinia peltophoroides-Sibipiruna)
Outubro in memoriam:
coração ebuliente de amor.
Sibipirunas então floridas
davam o tom.
Outubros,
a premência dos ciclos,
Sibipirunas em reflor.
Mas o tempo, o tempo
Vai colhendo distância
E esculpindo eternidade.
F.Campanella
Poema da série 'Efemérides'.
Outubro in memoriam:
coração ebuliente de amor.
Sibipirunas então floridas
davam o tom.
Outubros,
a premência dos ciclos,
Sibipirunas em reflor.
Mas o tempo, o tempo
Vai colhendo distância
E esculpindo eternidade.
F.Campanella
Poema da série 'Efemérides'.
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Fernando Campanella
segunda-feira, 11 de outubro de 2010
'SONHO'
Da tua branca e solitária ermida
Por caminhos de céu que a lua esmalta-
Desces –banhada dessa luz cobalta-
O linho d’asa abrindo sobre a vida.
Nada,teu passo calmo,sobre-salta
E quando a mágoa as almas intimida
Das ilusões,a turba renascida,
Em rondas espalha pela noite alta.
E a claridade que se faz é tanta
Que logo a terra fica cheia dessa
Sonora e estranha luz que alegra e canta.
E iluminada de um luar de outono
A alma feliz e impávida,atravessa
A vasta e longa escuridão do sono.
Mário Pederneiras
Rondas Noturnas-1.906
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Mário Pederneiras
segunda-feira, 4 de outubro de 2010
Delores Pires
Francisco, de Assis,
a ecologia terrestre
roga por clemência...
Delores Pires
4 de outubro – Dia de São Francisco
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Delores Pires
quinta-feira, 30 de setembro de 2010
Farra de cores
A Primavera se avizinha:
raízes e letras
exigem sua hora e tempo.
Caminho pelo jardim.
Espinhos do alfabeto,
Azaléias da alma insone.
Caminho entre seixos.
Busco o perfeito aquário,
Onze-horas e algas
orientam os peixes.
Pedras, nuvens e letras noir.
Tudo anuncia a Primavera:
discreta, Almíscar, esperta.
Em torno dos homens
entorna suas flores, perfume,
brisa, maresia e malícia.
Palavras azuis sobre o mar.
Sobre o marfim, música,
frases, orquídeas raras.
II
A Primavera caminha anônima
como homens e mulheres na rua,
afoita com tantas luas.
A Primavera espraia
graça entre samambaias,
escala buganvílias, assanha roseiras.
Espio, solene, sapos e flores;
espreito folhagens, livros antigos.
Refaço e traço veredas,
espelho versos contra o sol.
Entre seios de nuas mulheres,
abrigo meus olhos úmidos:
Vermelhos antúrios
em fins de madrugada.
Calculo frações primas e veras;
pernas, seios, trepadeiras e lírios.
Estrelas avessas da manhã,
casuarinas de sonhos.
III
A Primavera se avizinha:
enlouquece românticos e céticos,
com sua farra de cores;
seu derrame de felicidade.
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
raízes e letras
exigem sua hora e tempo.
Caminho pelo jardim.
Espinhos do alfabeto,
Azaléias da alma insone.
Caminho entre seixos.
Busco o perfeito aquário,
Onze-horas e algas
orientam os peixes.
Pedras, nuvens e letras noir.
Tudo anuncia a Primavera:
discreta, Almíscar, esperta.
Em torno dos homens
entorna suas flores, perfume,
brisa, maresia e malícia.
Palavras azuis sobre o mar.
Sobre o marfim, música,
frases, orquídeas raras.
II
A Primavera caminha anônima
como homens e mulheres na rua,
afoita com tantas luas.
A Primavera espraia
graça entre samambaias,
escala buganvílias, assanha roseiras.
Espio, solene, sapos e flores;
espreito folhagens, livros antigos.
Refaço e traço veredas,
espelho versos contra o sol.
Entre seios de nuas mulheres,
abrigo meus olhos úmidos:
Vermelhos antúrios
em fins de madrugada.
Calculo frações primas e veras;
pernas, seios, trepadeiras e lírios.
Estrelas avessas da manhã,
casuarinas de sonhos.
III
A Primavera se avizinha:
enlouquece românticos e céticos,
com sua farra de cores;
seu derrame de felicidade.
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
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Jairo De Britto
segunda-feira, 27 de setembro de 2010
CANÇÃO DO EXÍLIO
Alma,
Pássaro solitário,
Como é difícil abranger-te!
Nem sei como defender-te,
Incomensurável que és.
Num só crepúsculo,
Passeias todas as paisagens,
Visitas todas as terras,
E te recolhes triste
À morada que te serve
De cárcere...
Dantas Mota,*
De Planície dos Mortos (1945)
*Nascido em 22 de março de 1913, em Aiuruoca, cidade do Sul de Minas Gerais, a 370 quilômetros de Belo Horizonte, José Franklin Massena de Dantas Motta viveu mais de meio século dedicando-se à poesia e ao direito.
(1913-1974)
Pássaro solitário,
Como é difícil abranger-te!
Nem sei como defender-te,
Incomensurável que és.
Num só crepúsculo,
Passeias todas as paisagens,
Visitas todas as terras,
E te recolhes triste
À morada que te serve
De cárcere...
Dantas Mota,*
De Planície dos Mortos (1945)
*Nascido em 22 de março de 1913, em Aiuruoca, cidade do Sul de Minas Gerais, a 370 quilômetros de Belo Horizonte, José Franklin Massena de Dantas Motta viveu mais de meio século dedicando-se à poesia e ao direito.
(1913-1974)
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Dantas Mota
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
MAIS UMA PRIMAVERA
Mais um ano de intensa labuta,
Nesta vida muito bem vivida.
Sem nunca fugir da disputa,
Com a cabeça sempre erguida.
Mais um ano de tristeza,
Resistindo para não fraquejar.
Rogando aos céus por firmeza,
Para com rigor suportar.
Mais um ano de alegria,
E muita paz no coração.
Desfrutando da primazia,
De viver com amor e emoção.
Obrigado Senhor com louvores,
Por me dardes os bens, meus afetos.
Glorificando-me a vida com amores,
Minhas mulheres, filhos e netos.
Eu vos agradeço Senhor nesta hora,
Por ser real, e não uma quimera.
A graça de estar aqui, e agora,
Vivendo mais uma primavera.
23/09/2010
R.S. Furtado.
(1942-Natal-RN)
Parabéns ao querido amigo e poeta Rosemildo Sales Furtado e seus filhos,
que hoje aniversariam, desejamos e eles muita saúde, paz, amor e realizações.
Visite o blog do poeta:
http://arteemoes.blogspot.com/
Nesta vida muito bem vivida.
Sem nunca fugir da disputa,
Com a cabeça sempre erguida.
Mais um ano de tristeza,
Resistindo para não fraquejar.
Rogando aos céus por firmeza,
Para com rigor suportar.
Mais um ano de alegria,
E muita paz no coração.
Desfrutando da primazia,
De viver com amor e emoção.
Obrigado Senhor com louvores,
Por me dardes os bens, meus afetos.
Glorificando-me a vida com amores,
Minhas mulheres, filhos e netos.
Eu vos agradeço Senhor nesta hora,
Por ser real, e não uma quimera.
A graça de estar aqui, e agora,
Vivendo mais uma primavera.
23/09/2010
R.S. Furtado.
(1942-Natal-RN)
Parabéns ao querido amigo e poeta Rosemildo Sales Furtado e seus filhos,
que hoje aniversariam, desejamos e eles muita saúde, paz, amor e realizações.
Visite o blog do poeta:
http://arteemoes.blogspot.com/
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R.S.Furtado
O inverno se esvai.
A primavera se esmera
com flores e haicai...*
Delores Pires
* Dedicatória de lançamento
de O Livro dos Haicais (21.9.2001)
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Delores Pires
terça-feira, 21 de setembro de 2010
Primavera
Setembro entrou pela janela adentro,
com um puro frescor de primavera.
Inunda-se de luz toda a paisagem
e o meu canto transborda à tua espera.
A doçura da tarde é uma carícia.
Entreabrem-se flores docemente.
As nuvens estão nítidas e imóveis
no céu azul aberto à minha frente.
Há murmúrios e vozes pela rua.
Frescos risos distraem meus ouvidos
e ficam borbulhando como fonte
ou como choque de cristais partidos.
A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde.
como um rio fugindo de seu leito.
Minha pobre ternura ignorada,
minha heróica ternura impressentida,
teima em mostrar-se como a primavera,
pensa em tocar de leve a tua vida.
É difícil ser poeta e ser mulher.
É difícil cantar sem revelar.
Pode o poeta contar o seu segredo,
mas a mulher o seu deve guardar.
A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde,
como um rio fugindo de seu leito.
Fecharei a janela à primavera
e calarei o poeta nesta tarde,
para que o sonho em nada me perturbe,
nem meu canto transborde à tua espera.
Lila Ripoll
in Poemas e Canções.
com um puro frescor de primavera.
Inunda-se de luz toda a paisagem
e o meu canto transborda à tua espera.
A doçura da tarde é uma carícia.
Entreabrem-se flores docemente.
As nuvens estão nítidas e imóveis
no céu azul aberto à minha frente.
Há murmúrios e vozes pela rua.
Frescos risos distraem meus ouvidos
e ficam borbulhando como fonte
ou como choque de cristais partidos.
A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde.
como um rio fugindo de seu leito.
Minha pobre ternura ignorada,
minha heróica ternura impressentida,
teima em mostrar-se como a primavera,
pensa em tocar de leve a tua vida.
É difícil ser poeta e ser mulher.
É difícil cantar sem revelar.
Pode o poeta contar o seu segredo,
mas a mulher o seu deve guardar.
A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde,
como um rio fugindo de seu leito.
Fecharei a janela à primavera
e calarei o poeta nesta tarde,
para que o sonho em nada me perturbe,
nem meu canto transborde à tua espera.
Lila Ripoll
in Poemas e Canções.
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Lila Ripoll
segunda-feira, 20 de setembro de 2010
SONETO 4
O tempo é a gente – uma pessoa amiga
Com quem convido rumos a um novelo;
Pessoa longamente agora e antiga
Na esperança – retrato sem modelo.
Mas quando alguém se desenreda e morre
Em cada ponta a ponta que se escoa,
O tempo é como uma pessoa escorre
Da gente. E a gente nasce outra pessoa!
- “Alô espelho, aqui falando outrora
( Porque eu não disse não à tua espera? ).
Responde – quem morreu como quem era?”
É assim que o tempo desarruma –
Quatro pessoas, duas ou nenhuma?
Homero Frei
In: Interior do Tempo
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Homero Frei
sexta-feira, 17 de setembro de 2010
Pássaro e Mulher
Quem me prende
mais do que a terra?
Impossível o vôo
agora.
Quente fremente
a intenção de alguém.
Desfez-se a palidez
perdi meu vôo
nas grades de seu peito.
Aprísiona-me - grilhão -
o seio suave e
no calor do instante
a união.
Dora Ferreira da Silva
(1918—2006-SP)
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Dora Ferreira da Silve
Mulher e Pássaro
Linha invisível
liga-me àquela andorinha:
tato percorrendo
um trajeto
de comunhão. O pássaro
debate-se em meu peito.
Ou coração? A andorinha
se esvai na tarde. Leva consigo
o que não sei de mim.
Dora Ferreira da Silva
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Dora Ferreira da Silve
Chamar Pássaros
Chamar pássaros com o alpiste
de amá-los. Eles pousam nos parapeitos. Nem
sombra de medo nessa aproximação.
Quase me sinto gêmea do que são parados
à beira da janela ou saltando no telhado
recém-chegados.
A cordialidade dos pássaros é
sutil:
afloram o coração de quem os ama.
Dora Ferreira da Silva
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Dora Ferreira da Silve
quinta-feira, 16 de setembro de 2010
"IX"
Setembro floresce em sapucaias,
vórtice de abelha
em aroma roxo-lilás.
Logo a flor será cumbuca de fruto.
Bendito o tempo entre floração e semente,
doce a amêndoa
do beijo que eu consigo roubar.
Fernando Campanella
da série 'Efemérides'
vórtice de abelha
em aroma roxo-lilás.
Logo a flor será cumbuca de fruto.
Bendito o tempo entre floração e semente,
doce a amêndoa
do beijo que eu consigo roubar.
Fernando Campanella
da série 'Efemérides'
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Fernando Campanella
segunda-feira, 13 de setembro de 2010
MEU BARCO
Ele sempre chega,
quando meus sonhos canções
florescem verões.
Sempre parte,
quando lágrimas estrelas
escurecem meu poente.
Meu barco hoje,
só quero-o em brinquedo,
namorando em minhas águas. . .
. . . não quero vê-lo navegar!
. . . ilusões p’ra longe levar?
e talvez,
nunca mais voltar?
Alvina Tzovenos
In: Buscas de Infinitos
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Alvina Nunes Tzovenos
sexta-feira, 10 de setembro de 2010
'TÉDIO'
Tudo se acaba aos nossos olhos perto
Numa brancura que de ver nos cansa,
Como se então de névoas um deserto
Se abrisse assim sem luz nem esperança.
E nessa névoa que nos deixa incerto
E num abismo sem sentir nos lança,
Como se o olhar se visse então coberto
Sentimos se apagar nossa lembrança.
Sentimos um torpor indefinido,
Um vago sentimento adormecido
Como da morte as frias mãos felinas.
E nesse triste desalento infindo
De todo o céu sentimos ir fluindo
Neblinas e neblinas e neblinas...
Saturnino de Meireles
De Astros mortos (1903)
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Saturnino de Meireles
sábado, 28 de agosto de 2010
RESSONÂNCIA
Fico a ouvir cada som,
infindo ou fundo,
que me acata ou alcança.
Desconfio, mais e mais,
de cada um. Sem travas,
transam sem fim...
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
infindo ou fundo,
que me acata ou alcança.
Desconfio, mais e mais,
de cada um. Sem travas,
transam sem fim...
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
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Jairo De Britto
GOSTO DA LÍNGUA
Aquilo que ignoro,
alardeio.
Para mais poder
aprender.
Aquilo que ignoro,
alardeio.
Para melhor poder
apreender.
Aquilo que ignoro,
alardeio.
Para mais poder
saber.
Aquilo que ignoro,
escancaro.
Para, na ponta da língua,
avaro sabor todo sentir.
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
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Jairo De Britto
domingo, 22 de agosto de 2010
SUPOSIÇÕES
I
Suponha que não sei
como a conheço.
Talvez assim
meus olhos amanheçam.
II
Suponha que não sei
do lado avesso.
Talvez assim
minhas mãos o reconheçam.
III
Suponha que não sei
o exato endereço.
Talvez assim
meus ouvidos o traduzam.
IV
Suponha que não sei
o claro caminho.
Talvez assim
minhas pernas me conduzam.
V
Suponha que não sei
do bravo carinho.
Talvez assim
minha boca o descubra em canto.
VI
Suponha que não sei
quando ou como atravessar o rio.
Talvez assim
aprenda a nadar enquanto.
VII
Suponha que nada sei
do amor, viver ou ser.
Talvez assim
meus pés me levem até você.
Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"
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Jairo De Britto
quinta-feira, 12 de agosto de 2010
'POESIS'
A poesia é algo assim
Como uma dúbia certeza,
Aposta de um tudo
No oco intraduzível do nada,
Algo como a luz-menina dos olhos
Entreabrindo a opacidade,
Sumo delicado
Espremido de alegrias
E enfermidade,
Efemérides
E ainda um certo milagre,
Pérola pescada -
Insípida borboleta dos dias
Pela magia do verbo eterno
Encantada.
(Fernando Campanella)
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Fernando Campanella
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
"Cantilena"
solitário cri de um grilo
que se acasala a outros cris
e crispa de sonora eternidade
a sonolência úmida
de um jardim
Fernando Campanella
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Fernando Campanella
"Selvagem"
E Deus rogou as pragas.
Braquearas
trevos
ora-pro-nobis:
após as chuvas
um sapo estufa
e a vida estica.
Um pardal corteja
a flor conspícua
da tiririca.
Fernando Campanella
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Fernando Campanella
segunda-feira, 9 de agosto de 2010
Da Massa da Alma
XLVII
Tenho a alma feita de soluços
e dádivas sem recompensa
de matérias minerais sem substância
e substâncias sem matéria alguma.
Tenho a alma feita de piedade
da extensa e sobreposta que há no mundo
de destroços de geométricas ilusões
em verazes ferozes descampados.
Tenho a alma feita de meninos
e dos sonhos coloridos dos meninos
da aspiração (por fim) de não ser barro
mas as pedra que erige o tempo e o templo.
junho de 66
Álvaro Pacheco
In "Seleção de Poemas"(1984)
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Álvaro Pacheco
Memória
Deixar a memória
cumprir sua parte
juntar os pedaços
compor os seus itens
então reverter-se
do tempo e da carne
tornando-se apenas
um puro fluir
deixar que a memória
performe e execute
e sermos apenas
processing data
(e indeléveis registros).
Rio, outubro de 1972
Álvaro Pacheco
In "Seleção de Poemas"(1984)
Nascido em 26 de novembro de 1933, no Piauí, fez os seus primeiros estudos em Teresina, onde concluiu o Curso Ginasial, vindo para o Rio de Janeiro logo em seguida. No Colégio Salesiano Santa Rosa de Niterói fez o Curso Científico e formou-se em Direito em 1958 pela Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro. Exerceu a advocacia no Rio de 1957 a 1963.
Reside no Rio de Janeiro desde que saiu do Piauí. [set/1998]
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domingo, 8 de agosto de 2010
SONETO AO TEMPO
Na areia, aonde o mar encerra em ondas seu curso,
Fico olhando o horizonte, a brisa é leve, suave,
Meus pensamentos voam, as nuvens brincam no céu,
Sinto a liberdade daquele momento breve, que me leva...
Em poucos instantes, a minha alma leve flutua, nua,
longe das angústias desta vida, de seres camuflados,
mascarados de sorrisos, de palavras sem sentido,
pois sou eu que faço minha sombra, meu castelo na areia.
Ainda de frente ao mar, as lembranças fazem sua dança,
bailam ao meu redor, feito bailarinas em um palco, giram,
entre sorrisos e lágrimas, surgem e como num encanto se vão...
Assim, as marcas do tempo, em minha memória, presentes,
dispersas seguem seu rumo, e fico com um sorriso leve,
Tempo que se foi, na brisa, nas nuvens, nas ondas...em mim.
(Reggina Moon)
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Reggina Moon
quarta-feira, 4 de agosto de 2010
'Mar de solidão'
Aceito a solidão
da partida dos meus encantos,
na cadência monótona dos meus passos
anunciando auroras salpicadas
de orvalhos amargos das manhãs
Ventos errôneos das tardes,
regressam com roupagem cinza outonal,
sem semear fantasias,
convertendo a alma em ocasos
debruçados em seus tons de melodia
Ando sem pressa, sem lembranças
apenas o coração espera
entre o resto e o nada
de viagens profundas
nos desertos por onde passo.
Conceição Bentes
Publicado no Recanto das Letras em 04/08/10
Código do Texto: T2417359
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sexta-feira, 30 de julho de 2010
Identificação
Usando as mesmas palavras
Precisas e limitadas,
Os homens raro se entendem.
As almas se identificam
Nas graves coisas profundas,
Inominadas.
Helena Kolody
In: Poemas do Amor Impossível
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quinta-feira, 29 de julho de 2010
'Qietude'
Celebrar a cartase
suscetível dos pensamentos
ansiosos sejam de realizações
ou de frustrações .
Assim experimentar a
plenitude do absoluto
com o coração.
Filhos das estrelas
pulsando amor
no grande silêncio.
Pleno e vazio
banhado pela luz e paz,
na ausência do próximo
segmento frenético.
Manto de tranqüilidade.
Aharon
Nelson Aharon
Joenvile-SC
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domingo, 25 de julho de 2010
'Deixa-me seguir para o mar'
Tenta esquecer-me...
Ser lembrado é como evocar
Um fantasma...
Deixa-me ser o que sou,
O que sempre fui, um rio que vai fluindo...
Em vão, em minhas margens cantarão as horas,
Me recamarei de estrelas como um manto real,
Me bordarei de nuvens e de asas,
Às vezes virão a mim as crianças banhar-se...
Um espelho não guarda as coisas refletidas!
E o meu destino é seguir... é seguir para o Mar,
As imagens perdendo no caminho...
Deixa-me fluir, passar, cantar...
Toda a tristeza dos rios
É não poder parar!
Mario Quintana
Baú de espantos,
Editora Globo, Rio de Janeiro, 1986
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quarta-feira, 21 de julho de 2010
Rubis ao vento
ouvir ao vento,
ao virar vento
Ouvi de tua boca o silêncio, ansioso
de uma palavra hebraica, sem ânsia.
Andamos entre ruínas circulares
com Borges e alefes e golens...
descobrimo-nos nas solidões
tropicais, involuntariamente.
A palavra acumulada de nostalgia
do eco de um antigo deus ausente:
ecos divinos, arcaicos livros vivos.
Ouvi de tua boca o silêncio, ansioso.
São Paulo, Julho 1989
Vicente Cechelero
(Ascurra, SC, 13 de Janeiro de 1950 — Navegantes, SC, 16 de Abril de 2000)
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segunda-feira, 19 de julho de 2010
VIDA
Não digas
que estás só
se nunca sentiste
a verdadeira solidão
porque algum dia
poderás te encontrar
dolorosamente só.
Não reclames
da tragicidade
da vida...
Envolto nos problemas
descobrirás
o sentido de viver.
Verás então
que a vida
é bem mais bela
do que pensas.
Não afirmes
eu não amo
sem que disso
tenhas certeza.
Quando amares
- previne-te -
sofrerás!
Não maldigas
a noite escura.
Ela será
o acalento
da tua Tristeza Maior.
Não abandones
a estrelinha singela.
Quando estiveres triste
verás ser a estrela
tua amiga.
Buscarás consolo
nela
e serás feliz...
Delores Pires
In a Estrela e a Busca
Poema recebido através da amiga Dione Coppi Eller,
de "Gotas de poesias e outras essências"
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Delores Pires
domingo, 18 de julho de 2010
Torna viagem
Parasse o rio onde foi fonte,
ficasse a fonte onde foi nuvem,
voltasse o mar onde foi rio
para que o rio fosse chuva...
Assim esta rosa de outono
que já vai sendo minha vida,
seria folha, caule, seiva
e raiz da infância perdida!
Bandeira Tribuzi
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NOTURNO
Certa presença concreta da noite vem
insinua-se infiltra-se e entorpece
de serenidade ou angústia. Ou dupla
embala em sonho em acre e em silêncio
Vem materna e serena mas corpórea
e afaga o descanso e entoa a canção inatingível
Então se avoluma o esquecimento e envolve-me e avança
comigo nos braços para a distância e o sonho perfeito
Bandeira Tribuzi
In: Poesias Completas
Bandeira Tribuzi, pseudônimo de José Tribuzi Pinheiro Gomes,(São Luís, Maranhão, 2 de fevereiro de 1927 — 8 de setembro de 1977)
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quinta-feira, 15 de julho de 2010
PAISAGEM POR DENTRO
Abro os braços
para a paisagem
descortinada janela a fora,
aos olhos que se arregalam.
E o coração:
- a vida é bela bebida aos poucos.
O verde enverdece o sol,
o amarelo traz fruta – esperança,
a saudade em chuva e orvalho
cai (dos tempos de criança).
Bate-me por dentro, nas laterais:
- as narinas sentem
e os ouvidos ouvem
o vento
e seus mistérios e eflúvios,
arrepiando a pele como tentáculos.
A alma que voava
me pousou
na beira do sonho.
Francisco Miguel de Moura
(Jenipapeiro,Piauí- 16 de junho de 1933)
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Francisco Miguel de Moura
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