Seja bem-vindo. Hoje é

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Farra de cores

A Primavera se avizinha:
raízes e letras
exigem sua hora e tempo.

Caminho pelo jardim.

Espinhos do alfabeto,
Azaléias da alma insone.

Caminho entre seixos.

Busco o perfeito aquário,
Onze-horas e algas
orientam os peixes.

Pedras, nuvens e letras noir.
Tudo anuncia a Primavera:
discreta, Almíscar, esperta.

Em torno dos homens
entorna suas flores, perfume,
brisa, maresia e malícia.

Palavras azuis sobre o mar.
Sobre o marfim, música,
frases, orquídeas raras.

II

A Primavera caminha anônima
como homens e mulheres na rua,
afoita com tantas luas.

A Primavera espraia
graça entre samambaias,
escala buganvílias, assanha roseiras.

Espio, solene, sapos e flores;
espreito folhagens, livros antigos.

Refaço e traço veredas,
espelho versos contra o sol.

Entre seios de nuas mulheres,
abrigo meus olhos úmidos:

Vermelhos antúrios
em fins de madrugada.

Calculo frações primas e veras;
pernas, seios, trepadeiras e lírios.

Estrelas avessas da manhã,
casuarinas de sonhos.


III

A Primavera se avizinha:
enlouquece românticos e céticos,
com sua farra de cores;
seu derrame de felicidade.


Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

CANÇÃO DO EXÍLIO

Alma,
Pássaro solitário,
Como é difícil abranger-te!
Nem sei como defender-te,
Incomensurável que és.
Num só crepúsculo,
Passeias todas as paisagens,
Visitas todas as terras,
E te recolhes triste
À morada que te serve
De cárcere...

Dantas Mota,*
De Planície dos Mortos (1945)
*Nascido em 22 de março de 1913, em Aiuruoca, cidade do Sul de Minas Gerais, a 370 quilômetros de Belo Horizonte, José Franklin Massena de Dantas Motta viveu mais de meio século dedicando-se à poesia e ao direito.
(1913-1974)

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

MAIS UMA PRIMAVERA

Mais um ano de intensa labuta,
Nesta vida muito bem vivida.
Sem nunca fugir da disputa,
Com a cabeça sempre erguida.

Mais um ano de tristeza,
Resistindo para não fraquejar.
Rogando aos céus por firmeza,
Para com rigor suportar.

Mais um ano de alegria,
E muita paz no coração.
Desfrutando da primazia,
De viver com amor e emoção.

Obrigado Senhor com louvores,
Por me dardes os bens, meus afetos.
Glorificando-me a vida com amores,
Minhas mulheres, filhos e netos.

Eu vos agradeço Senhor nesta hora,
Por ser real, e não uma quimera.
A graça de estar aqui, e agora,
Vivendo mais uma primavera.

23/09/2010

R.S. Furtado.
(1942-Natal-RN)


Parabéns ao querido amigo e poeta Rosemildo Sales Furtado e seus filhos,
que hoje aniversariam, desejamos e eles muita saúde, paz, amor e realizações.
Visite o blog do poeta:
http://arteemoes.blogspot.com/

O inverno se esvai.
A primavera se esmera
com flores e haicai...*

Delores Pires
* Dedicatória de lançamento
de O Livro dos Haicais (21.9.2001)

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Primavera


Setembro entrou pela janela adentro,
com um puro frescor de primavera.
Inunda-se de luz toda a paisagem
e o meu canto transborda à tua espera.

A doçura da tarde é uma carícia.
Entreabrem-se flores docemente.
As nuvens estão nítidas e imóveis
no céu azul aberto à minha frente.

Há murmúrios e vozes pela rua.
Frescos risos distraem meus ouvidos
e ficam borbulhando como fonte
ou como choque de cristais partidos.

A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde.
como um rio fugindo de seu leito.

Minha pobre ternura ignorada,
minha heróica ternura impressentida,
teima em mostrar-se como a primavera,
pensa em tocar de leve a tua vida.

É difícil ser poeta e ser mulher.
É difícil cantar sem revelar.
Pode o poeta contar o seu segredo,
mas a mulher o seu deve guardar.

A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde,
como um rio fugindo de seu leito.

Fecharei a janela à primavera
e calarei o poeta nesta tarde,
para que o sonho em nada me perturbe,
nem meu canto transborde à tua espera.


Lila Ripoll
in Poemas e Canções.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

SONETO 4


O tempo é a gente – uma pessoa amiga
Com quem convido rumos a um novelo;
Pessoa longamente agora e antiga
Na esperança – retrato sem modelo.
Mas quando alguém se desenreda e morre
Em cada ponta a ponta que se escoa,
O tempo é como uma pessoa escorre
Da gente. E a gente nasce outra pessoa!
- “Alô espelho, aqui falando outrora
( Porque eu não disse não à tua espera? ).
Responde – quem morreu como quem era?”
É assim que o tempo desarruma –
Quatro pessoas, duas ou nenhuma?


Homero Frei
In: Interior do Tempo

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Pássaro e Mulher


Quem me prende
mais do que a terra?
Impossível o vôo
agora.
Quente fremente
a intenção de alguém.
Desfez-se a palidez
perdi meu vôo
nas grades de seu peito.
Aprísiona-me - grilhão -
o seio suave e
no calor do instante
a união.

Dora Ferreira da Silva
(1918—2006-SP)

Mulher e Pássaro


Linha invisível
liga-me àquela andorinha:
tato percorrendo
um trajeto
de comunhão. O pássaro
debate-se em meu peito.
Ou coração? A andorinha
se esvai na tarde. Leva consigo
o que não sei de mim.


Dora Ferreira da Silva

Chamar Pássaros


Chamar pássaros com o alpiste
de amá-los. Eles pousam nos parapeitos. Nem
sombra de medo nessa aproximação.
Quase me sinto gêmea do que são parados
à beira da janela ou saltando no telhado
recém-chegados.

A cordialidade dos pássaros é

sutil:
afloram o coração de quem os ama.


Dora Ferreira da Silva

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

"IX"


Setembro floresce em sapucaias,
vórtice de abelha
em aroma roxo-lilás.
Logo a flor será cumbuca de fruto.
Bendito o tempo entre floração e semente,
doce a amêndoa
do beijo que eu consigo roubar.


Fernando Campanella
da série 'Efemérides'

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

MEU BARCO


Ele sempre chega,
quando meus sonhos canções
florescem verões.


Sempre parte,
quando lágrimas estrelas
escurecem meu poente.


Meu barco hoje,
só quero-o em brinquedo,
namorando em minhas águas. . .
. . . não quero vê-lo navegar!
. . . ilusões p’ra longe levar?
e talvez,
nunca mais voltar?


Alvina Tzovenos
In: Buscas de Infinitos

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

'TÉDIO'


Tudo se acaba aos nossos olhos perto
Numa brancura que de ver nos cansa,
Como se então de névoas um deserto
Se abrisse assim sem luz nem esperança.

E nessa névoa que nos deixa incerto
E num abismo sem sentir nos lança,
Como se o olhar se visse então coberto
Sentimos se apagar nossa lembrança.

Sentimos um torpor indefinido,
Um vago sentimento adormecido
Como da morte as frias mãos felinas.


E nesse triste desalento infindo
De todo o céu sentimos ir fluindo
Neblinas e neblinas e neblinas...


Saturnino de Meireles
De Astros mortos (1903)

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Farra de cores

A Primavera se avizinha:
raízes e letras
exigem sua hora e tempo.

Caminho pelo jardim.

Espinhos do alfabeto,
Azaléias da alma insone.

Caminho entre seixos.

Busco o perfeito aquário,
Onze-horas e algas
orientam os peixes.

Pedras, nuvens e letras noir.
Tudo anuncia a Primavera:
discreta, Almíscar, esperta.

Em torno dos homens
entorna suas flores, perfume,
brisa, maresia e malícia.

Palavras azuis sobre o mar.
Sobre o marfim, música,
frases, orquídeas raras.

II

A Primavera caminha anônima
como homens e mulheres na rua,
afoita com tantas luas.

A Primavera espraia
graça entre samambaias,
escala buganvílias, assanha roseiras.

Espio, solene, sapos e flores;
espreito folhagens, livros antigos.

Refaço e traço veredas,
espelho versos contra o sol.

Entre seios de nuas mulheres,
abrigo meus olhos úmidos:

Vermelhos antúrios
em fins de madrugada.

Calculo frações primas e veras;
pernas, seios, trepadeiras e lírios.

Estrelas avessas da manhã,
casuarinas de sonhos.


III

A Primavera se avizinha:
enlouquece românticos e céticos,
com sua farra de cores;
seu derrame de felicidade.


Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

CANÇÃO DO EXÍLIO

Alma,
Pássaro solitário,
Como é difícil abranger-te!
Nem sei como defender-te,
Incomensurável que és.
Num só crepúsculo,
Passeias todas as paisagens,
Visitas todas as terras,
E te recolhes triste
À morada que te serve
De cárcere...

Dantas Mota,*
De Planície dos Mortos (1945)
*Nascido em 22 de março de 1913, em Aiuruoca, cidade do Sul de Minas Gerais, a 370 quilômetros de Belo Horizonte, José Franklin Massena de Dantas Motta viveu mais de meio século dedicando-se à poesia e ao direito.
(1913-1974)

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

MAIS UMA PRIMAVERA

Mais um ano de intensa labuta,
Nesta vida muito bem vivida.
Sem nunca fugir da disputa,
Com a cabeça sempre erguida.

Mais um ano de tristeza,
Resistindo para não fraquejar.
Rogando aos céus por firmeza,
Para com rigor suportar.

Mais um ano de alegria,
E muita paz no coração.
Desfrutando da primazia,
De viver com amor e emoção.

Obrigado Senhor com louvores,
Por me dardes os bens, meus afetos.
Glorificando-me a vida com amores,
Minhas mulheres, filhos e netos.

Eu vos agradeço Senhor nesta hora,
Por ser real, e não uma quimera.
A graça de estar aqui, e agora,
Vivendo mais uma primavera.

23/09/2010

R.S. Furtado.
(1942-Natal-RN)


Parabéns ao querido amigo e poeta Rosemildo Sales Furtado e seus filhos,
que hoje aniversariam, desejamos e eles muita saúde, paz, amor e realizações.
Visite o blog do poeta:
http://arteemoes.blogspot.com/

O inverno se esvai.
A primavera se esmera
com flores e haicai...*

Delores Pires
* Dedicatória de lançamento
de O Livro dos Haicais (21.9.2001)

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Primavera


Setembro entrou pela janela adentro,
com um puro frescor de primavera.
Inunda-se de luz toda a paisagem
e o meu canto transborda à tua espera.

A doçura da tarde é uma carícia.
Entreabrem-se flores docemente.
As nuvens estão nítidas e imóveis
no céu azul aberto à minha frente.

Há murmúrios e vozes pela rua.
Frescos risos distraem meus ouvidos
e ficam borbulhando como fonte
ou como choque de cristais partidos.

A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde.
como um rio fugindo de seu leito.

Minha pobre ternura ignorada,
minha heróica ternura impressentida,
teima em mostrar-se como a primavera,
pensa em tocar de leve a tua vida.

É difícil ser poeta e ser mulher.
É difícil cantar sem revelar.
Pode o poeta contar o seu segredo,
mas a mulher o seu deve guardar.

A ternura contida de meu peito
ameaça transbordar dentro da tarde,
como um rio fugindo de seu leito.

Fecharei a janela à primavera
e calarei o poeta nesta tarde,
para que o sonho em nada me perturbe,
nem meu canto transborde à tua espera.


Lila Ripoll
in Poemas e Canções.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

SONETO 4


O tempo é a gente – uma pessoa amiga
Com quem convido rumos a um novelo;
Pessoa longamente agora e antiga
Na esperança – retrato sem modelo.
Mas quando alguém se desenreda e morre
Em cada ponta a ponta que se escoa,
O tempo é como uma pessoa escorre
Da gente. E a gente nasce outra pessoa!
- “Alô espelho, aqui falando outrora
( Porque eu não disse não à tua espera? ).
Responde – quem morreu como quem era?”
É assim que o tempo desarruma –
Quatro pessoas, duas ou nenhuma?


Homero Frei
In: Interior do Tempo

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Pássaro e Mulher


Quem me prende
mais do que a terra?
Impossível o vôo
agora.
Quente fremente
a intenção de alguém.
Desfez-se a palidez
perdi meu vôo
nas grades de seu peito.
Aprísiona-me - grilhão -
o seio suave e
no calor do instante
a união.

Dora Ferreira da Silva
(1918—2006-SP)

Mulher e Pássaro


Linha invisível
liga-me àquela andorinha:
tato percorrendo
um trajeto
de comunhão. O pássaro
debate-se em meu peito.
Ou coração? A andorinha
se esvai na tarde. Leva consigo
o que não sei de mim.


Dora Ferreira da Silva

Chamar Pássaros


Chamar pássaros com o alpiste
de amá-los. Eles pousam nos parapeitos. Nem
sombra de medo nessa aproximação.
Quase me sinto gêmea do que são parados
à beira da janela ou saltando no telhado
recém-chegados.

A cordialidade dos pássaros é

sutil:
afloram o coração de quem os ama.


Dora Ferreira da Silva

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

"IX"


Setembro floresce em sapucaias,
vórtice de abelha
em aroma roxo-lilás.
Logo a flor será cumbuca de fruto.
Bendito o tempo entre floração e semente,
doce a amêndoa
do beijo que eu consigo roubar.


Fernando Campanella
da série 'Efemérides'

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

MEU BARCO


Ele sempre chega,
quando meus sonhos canções
florescem verões.


Sempre parte,
quando lágrimas estrelas
escurecem meu poente.


Meu barco hoje,
só quero-o em brinquedo,
namorando em minhas águas. . .
. . . não quero vê-lo navegar!
. . . ilusões p’ra longe levar?
e talvez,
nunca mais voltar?


Alvina Tzovenos
In: Buscas de Infinitos

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

'TÉDIO'


Tudo se acaba aos nossos olhos perto
Numa brancura que de ver nos cansa,
Como se então de névoas um deserto
Se abrisse assim sem luz nem esperança.

E nessa névoa que nos deixa incerto
E num abismo sem sentir nos lança,
Como se o olhar se visse então coberto
Sentimos se apagar nossa lembrança.

Sentimos um torpor indefinido,
Um vago sentimento adormecido
Como da morte as frias mãos felinas.


E nesse triste desalento infindo
De todo o céu sentimos ir fluindo
Neblinas e neblinas e neblinas...


Saturnino de Meireles
De Astros mortos (1903)