Seja bem-vindo. Hoje é

domingo, 30 de agosto de 2009

DESCOMPASSOS



Baila sob a luz das estrelas.
Desata o fio de teus sapatos.
Deixa que o sol te beije de esperanças e risos.
Faze de tua vida
um hino ao beijar os olhos da manhã
uma harpa ao por os pés no ventre da noite
um rodopio de azuis, de conchas e de búzios.


Deixa que o vento brinque com teus pés
a chuva te beije ate se cansar
as flores e os verdes e os caracóis
enfeitem teus cabelos de verões.


Corre atrás da vida com ternura de criança
e canções plenas de paz
e com risos de palhaços
porque tudo, todos nos
brincamos de viver bem
sempre, sempre
num carrossel
no circo da vida.



Alvina Nunes Tzovenos
In: Palavras ao Tempo
(Porto Alegre- RS- 1929)

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

VIVER É DESAFIAR


(John William Waterhouse, British Painter, 1849-1917)

Mulher,
Teu nome é coragem!
Viva inteira os teus papéis,
A tua multiplicidade...
Não permita cerceamento,
Persiga a felicidade!
Exiba o sentimento,
A essência, o desafio
E a coragem.
Retoma as rédeas!
Nada de fraquejar!
Arquiteta o teu destino,
Pois viver é desafiar,
Enfrentar as tormentas
E chegar em alto mar.

Selma Regina de Moraes

quinta-feira, 27 de agosto de 2009



Formatação da amiga e poetisa Regina Helena.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Quando eu passar a porta escura



Quando eu passar a porta escura
e minha ausência deixar saudade
quando sentires minha falta tanta,
e for tamanha a dor que sintas,
abre meu livro em qualquer hora,
e então me leias e me devora.

Vais descobrir minhas lembranças,
de meus amores tempo afora,
das muitas coisas que fui e fiz,
de tantas outras que quis outrora.

Frases de mim, do que fui e sou,
coisas de ti, entre palavras,
falo de amores, falo de mágoas,
falo de tudo porque passei,
porque pequei, porque paguei.

Relembro encontros que me ensinaram,
muitos alguéns que já não importam
Mostro a minha vida que vivo agora,
mais feliz por me entender
e atender meus desejos todos,
alguns tão tolos,outros nem tantos,
mas sempre puros.
Quando eu passar a porta escura,
lembra de mim assim.

Luiz Alberto dos Santos Monjeló

(Queríamos deixar registrada as nossas desculpas ao poeta Monjeló, porque anteriormente, postamos esse poema como sendo de Aníbal Beça. Corrigimos e novamente pedimos mil desculpas.)

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

VERDADE


(Paint by Emile Vernon)

No fundo,
Somos todos crianças,
Em permanente aprendizado.

Felizes
Os vêem essa verdade,
Sem deixar que a natural
E humana fragilidade
Seja desculpa
Para o enfrentamento
De cada obstáculo,
De cada desafio
Que nos darão bagagem,
Discernimento e preparo
Para o final dessa viagem.

Esse experimento
Fortalece, enobrece...
Sem a perda da ternura
E da esperança
Que nos faz
Ser sempre uma criança.

Selma Regina de Moraes
(Rio de Janeiro)

'Ondas Dentro de Mim'


(Charles Chaplin,French Academic Painter, 1825-1891)

Amei , com a delicadeza de quem segura nas mãos
uma bolha de sabão
com o cuidado de quem tece fios de seda,
acalentei a própria vida
Esperei, como quem contempla o sol
após a chuva torrencial
Desejei, como quem almeja a paz
depois que o estrondo jaz
Não contemplo águas paradas
persigo o movimento que há nas estradas
Hoje, não é o fim
encontro ondas dentro de mim
ainda amo, acalento, espero, desejo..
transformo cada momento num ensejo


Úrsula Avner
(Minas Gerais)

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Destes tristes dobrados da canção



Destes tristes dobrados da canção,
da ágrafa manhã, ágrafo ardor,
ressoa-se dos sorrisos dos irmãos,
tristeza céu do azul tardia dor.

Cante, cante do pássaro, dor sino,
se sutil deste pássaro, à tardinha,
fazendo deste voar látego do hino,
murmúrio desta voz paz da ladainha.

Se tangem destas tardes dos passos,
se batem destas flores brandos pálio,
deste homem sofrido, dos ossos.

Da tristeza, refrãos da tarde ardor,
tenho apenas versos do salário,
tangendo sutil poeta desta dor.


Eric Ponty
(Minas Gerais)

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Instância



Quem volta ao lugar perdido
quer ver o tempo.
Não vê a casa, o muro, o degrau mais fino:
quer no bater do coração o antigo.

Espanta a resistência daquela árvore,
a mesma e outra nesta floração.
Espanta a cor fiel dos azulejos,
a penumbra e o tom daquele quarto
desenhados na pauta de outros olhos.

Quem retorna não mora no outro tempo,
embora imite o rosto ancestral.
Quem retorna medita. Não cruza o corredor
como planava a mosca distraída.

Pode-se sentar na escada, prover os olhos
com a massa do cenário inocente.
Livre-se o coração para a verdade
desta árvore em gala de outro amor.

Alcides Villaça
In: Viagem de Trem-1988-
(Atibaia- São Paulo-1946)

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

ENSAIO



Levanta-te – é preciso; o Sol inda abastece
o cimo da consciência e a voz o verbo, uivante,
acende na memória a tocha flamejante
da rima cobiçada ao verso que enternece.

Registra pois, em tempo, o sonho – doce amante
que paira além da vida e que contempla a messe
já posta no celeiro, assim, do que fenece,
importa muito pouco ao cérebro escaldante.

Levanta-te e contempla a música irrequieta
que nasce dentro d’alma e baila, tal profeta
ao ter codificado a luz do pensamento...

Ensaia o vôo agora; insiste nas alturas.
Quando a alma se equilibra, além das desventuras,
por certo estará pronta a desposar o vento.


Jandira Grillo
In: Uma Canção de Amor para Você
Academia Amparense de Letras

FRAGA E SOMBRA



A sombra azul da tarde nos confrange.
Baixa, severa, a luz crepuscular.
Um sino toca, e não saber quem tange
é como se este som nascesse do ar.

Música breve, noite longa. O alfanje
que sono e sonho ceifa devagar
mal se desenha, fino, ante a falange
das nuvens esquecidas de passar.

Os dois apenas, entre céu e terra,
sentimos o espetáculo do mundo,
feito de mar ausente e abstrata serra.

E calcamos em nós, sob o profundo
instinto de existir, outra mais pura
vontade de anular a criatura.

Carlos Drummond de Andrade
in: Claro Enigma -1951-

terça-feira, 18 de agosto de 2009

TEMA DA ROSA / I



Parecia uma rosa madrugando
Aquela rosa ali, naquele dia.
Era quando em redor amanhecia,
Porém sem Lugar-Onde ou Tempo-Quando,
Estava eterna e eterna parecia.
Não se sabia a luz que a estava olhando,
Ou se ela olhava a luz desabrochando,
Nem se era dela que esta luz surgia.
Nada movia em torno, mas da haste
Parecia vibrar, tensa e nervosa,
A onda de um acorde num segundo
Sonhando em rubro e alheio a seu engaste,
Que era a história das rosas numa rosa,
A rosa em si, dentro de si, no mundo.

Jorge Wanderley
De Manias de Agora (1995)
(Pernambuco-1938-1999)

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

RESQUÍCIO



Às vezes
A dor de chuvas passadas
Cai em mim fina,
Reelaborada,
A ponto de não ser eu
Assim mais que bolhas
Na espuma da tarde
Molhada.

(Fernando Campanella)

“GITANO”


('Gypsy with a Mandolin'by Jean- Baptiste Camille Corot)


amor cigano
é bela viola
oco de dentro
em canto por fora

asas que arrastam
é ave rompante

beijos que explodem
e viram abóbora

luas em transe
vagas de mar
jades que chamam

areias que cedem
- sereia de tranças
onde vou me enredar

febre do mato
amor vaga-lume

vinhos que encorpam
em porres baratos

grifes que deixam
perfumes prescritos

fome de romãs
nos entreatos


(Fernando Campanella)


Nossa pequena homenagem a maravilhosa poeta Patrícia Neme, que hoje aniversaria.
Muito obrigada pelos versos que nós presenteias com tanto carinho e amor.
Que teu caminho seja repleto das cores da alegria, e se pedras houver, que sejam pequenas e se desfaçam com o vento da paz.
Muito grata por existires e seres como és!
Parabéns pelo aniversário.
14/08/2009


(Patrícia Neme)

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

PRINCÍPIO REVERSO



Toda estória tem dois lados,
como a moeda da própria história.
Como o dia e a noite,
como o gelo e o fogo:
verão, inverno, céu e inferno.

Toda memória tem dois fados,
como a beleza e a falácia da glória.
Como o imóvel e o veloz,
como o crédulo e o néscio:
lume, escuro, verão e inverno.

Toda história tem dois fardos,
como a sacola e o silêncio do viajante.
Como a tristeza e a grandeza do nascer,
como a pura luz e o tempo voraz:
espaço, sal, sangue
e o infinito terror do viver.


- Jairo De Britto -

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

EVANGELHO DA SOMBRA E DO SILÊNCIO


("Rainy Day" by Alexander Volkov)


O silêncio das Coisas me comove;
Sinto-o, principalmente quando chove.

Que sonolência enerva as almas... Que apatia...
Que saudade da vida e da alegria!

Que saudade de tudo que ama e existe!
Como me encanta a natureza triste!

Olho através dos vidros da janela:
A paisagem desfaz-se em folhas amarelas...

Ver árvores é um grande lenitivo
Para a estesia de um contemplativo.

Ver árvores é ouvir sentidas trovas,
Vossas cantigas, raparigas novas!

Que lindo verde, em nuanças meio incertas,
Margeando, lado a lado, as estradas desertas!

As árvores dos parques e das praças
Bebem silêncio pelas folhas que são taças...

Só parece que a sombra em redor se avoluma
E cresce e desenrola o amplo manto de bruma.

É tudo calma. Em torno à minha casa
Não se escuta sequer um ruflo de asa.

Somente a água que vem da montanha, sonora,
Canta tão triste que não canta, chora.

E some-se, rezando a estranha reza
Da livre religião da natureza,

Ave, Sombra! Eu venero a tua imagem
E amo o silêncio verde da paisagem!...



Olegário Marianno
Toda uma Vida de Poesia – 1.957 –
(1889-1958- Recife)

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

circunflexo



O vôo circunflexo de uma ave,
ponto de exclamação e convergência
de um olhar mais que nítido: vazado.
(- E, transpassada por um vento externo e interno,
a praça, com janelas para a praça.)


Deixamos de esperar que alguma dança
perdoe nosso espaço alucinado.
O desenho dos gestos se extravia,
A dor se agrava, grava em nós seu mapa.


Pouco faltou para que nosso invento
tivesse sopro, fosse além do traço:
navegação, mais rápida que a barca,
ia tecendo sua própria água.


As linhas, uma a uma, caem mortas
Diante desta manhã, trava, aguçada
Pelas doces palavras desarmadas.


Rubens Rodrigues Torres Filho
In: O Vôo Circunflexo

‘Busca’



Na rua escura caminho, enquanto a chuva cai
formando com as minhas lágrimas
uma densa cortina que não me separa
da dor de te buscar

Em meio ao som da chuva
ouço o meu coração
batendo na cadência dos meus passos,
arrastando a água...

tudo é inútil, eu sei
e vejo agonizar em mim a esperança.
...e então, mergulho de vez na embriaguez
da mística loucura da saudade.

Regina Helena

domingo, 9 de agosto de 2009

CONFISSÃO DE PAI PARA FILHO


( Nanu Ram Jogi)

Filho, abro a janela para o amanhã
e não há nisso um vestígio de esperança.

Aceito a imposição de um novo dia
enquanto aguardo a hora do pão fresco.

Vivo intensamente o nada de em seguida
como um centauro ultrapassando o mito.

O que faço não marca o acontecimento,
senão o fechamento nulíparolunar
das portas dos dias das horas do tempo.

Sento-me à mesa e repito com a fome
o golpe traiçoeiro da abastança.

Filho, abro o jornal e devoro uma notícia
que custou um sangue anônimo qualquer.

Eu não quero ser cúmplice do mundo.
Vou ao trabalho ou não vou,
ponho a gravata ou não ponho.

Afinal eu sou o que não muda o curso
de nada segundo a minha preferência.

Qualquer alternativa é uma imposição
do agora ilhado no tempo.

O passado foi e o futuro é na cozinha
onde a carne está sendo retalhada...

Enquanto isso, $uborno com produtos
importados a viciada alfândega do coração,
malgrado os impostos escorchantes
devidos à amável consciência...


A. Estebanez

Um feliz e especial dia a todos os pais amigos desse blog!

"SPLEENBORED"



Llorar por todo lo que se perdió
Lloro por mí, que me perdí de mí..
Por quién he sido – y si es que esto ocurrió…
Como yo soy… Y como lloro así.

Hasta llorar por quién ya me olvidó
Llorar por nada… Lo que no és tán malo…
Tan solamente llorar por llorar
Desde el comienzo de mi propio fin.

Dejadme quieto, borracho de asombro
Sin la resaca de todo mi llanto
De una pasión que vive en desatino.

Dejadme el llanto por mi amada rosa
Porqué aún creo que el rocío es canto
De la semilla en su final destino.

Afonso Estebanez
(Dedicado com carinho à minha Mestra
Maria Madalena Cigarán Schuck
Versão: Patrícia Neme)

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

O céu é sempre o mesmo: as nossas almas



O céu é sempre o mesmo: as nossas almas
É que se mudam, contemplando-o. É certo.
Umas vezes está cheio de palmas;
Outras vezes é só como um deserto.

Quem sabe quando vem as horas calmas?
Quem sabe se a ventura vem bem perto?
Homem de carne infiel, em vão espalmas
As tuas asas pelo céu aberto.

O que nos cerca é a fugitiva imagem
Do que sentimos, do que longe vemos,
Sempre sofrendo, sempre em vassalagem.

A vida é um barco a voar. Soltem-se os remos...
Cada um de nós da morte é servo e pagem:
Somos felizes só porque morremos.


Alphonsus de Guimaraens
In: 'Obra completa'

Fiz do verde meu caminho...



Fiz do verde meu caminho,
fiz da vida plantação;
plantei flor e passarinho,
filhos, versos e oração.
Plantei pão e plantei vinho,
com o amor da minha mão.
Caminhei por verdes mares,
fiz sorrir verdes olhares,
verde foi o meu jardim.
Verde foi minha esperança
no verdor das minhas tranças...
Hoje restam só lembranças
com as quais brinco cantares
da ventura que há em mim.
O Senhor é meu pastor
e nas verdes pradarias
me regala paz sem fim!

- Patricia Neme -

domingo, 2 de agosto de 2009

O dia



Das profundezas da tarde vem o dia em que se vive eternamente
igual à água múrmura entre os rochedos
onde se ocultam na antemanhã os peixes perseguidos pelos
homens.

Não se percebe o outro dia melodioso lá fora
nas perspectivas dos arranha-céus, nos cinemas e no trânsito.
A hora tem uma espessura de segredo guardado
e as gargantas de onde as sedes emigraram
suplicam apenas o que sobrou do frio e do sono.

As imprecações dormem no ar, com uma resistência de anjos,
e as doçuras se desfiguram numa ilusão de joelhos fendidos
n'água

como se os corpos sentissem que o tempo foi embora.
A vida, liberta dos vocabulários eventuais, festeja-se sem
memória

no espírito acorrentado a um infinito agora
eternamente presente como o oceano nas praias.


Lêdo Ivo
(Cântico, 1949.)
(Maceió - 1924)

EPITALÂMIO



Apenas as gotas de chuva: compassadas e mansas.
A folhagem, lá fora, adormeceu feliz.
Despertando na relva, cantam grilos baixinho.
A confidência da chuva, a confidência dos grilos,
Tudo que vem da noite é surdina e doçura.

Certeza não direi, mas direi: esperança.
Deves pensar em mim neste momento mesmo.
Teu pensamento é o meu, tua esperança é a minha.
Através do espaço,não é verdade? as nossas mãos
Estão apertadas, em segredo.
Sinto que o nosso amor era grande como a noite
E que o melhor de nós habita na distância
Que nos espera.


Ribeiro Couto
In Poesias Consagradas Vol.3
(São Paulo- 1898-1963)

“Os objetos”



As coisas monótonas repetem-se ao clima habitual:
um retângulo de janela, um cinzeiro, uma bilha, a paisagem
(algumas vezes o céu administra pássaros que, ao
instalar-se no espaço, anunciam outra imagem).

Apelo às lâmpadas domesticadas, cuja luz
intervém em meu procedimento mínimo e forte.
Mas os objetos têm uma certa serenidade que produz
em tempo disponível, n’alma, os pânicos da morte.

Vejo-os diários, metódicos, sólidos e agressivos,
por sua íntima certeza de símbolos urgentes
dominando o real absurdo, onde trazem, cativos,
os abstratos homens, ilógicos e impotentes.

Sou a única atitude na inércia das pedras mortas
reciprocamente solidárias, a transcorrer.
E já me resta apenas o recurso de cerrar todas as portas
aguardando a ideal identificação: morrer.


Lago Burnett
(Maranhão- 1929-1995)

TRISTEZA DA RUA



A tristeza da rua
vem dos que vêm e que vão.
Dos que não querem chegar aonde vão
e vão andando.
Dos que não têm aonde ir
e vão andando.
Dos que não têm pra onde voltar
e vão voltando.
Dos que voltam sem trazer
o que foram buscar.

Geraldino Brasil

RECEITA DE PERFUME


(Tilia cordata Mill)

de altura máxima
ressangra e basta
o sol botão

assombra valeriano
os espinheiros:
tílias

que coram glaucas
puras
em tudo amorosas:

não pede
luz
o íntimo das rosas

Antonio Fernando de Franceschi
in A Olho Nu

(Photo que ilustra o poema é de Moitas61- Flick)

domingo, 30 de agosto de 2009

DESCOMPASSOS



Baila sob a luz das estrelas.
Desata o fio de teus sapatos.
Deixa que o sol te beije de esperanças e risos.
Faze de tua vida
um hino ao beijar os olhos da manhã
uma harpa ao por os pés no ventre da noite
um rodopio de azuis, de conchas e de búzios.


Deixa que o vento brinque com teus pés
a chuva te beije ate se cansar
as flores e os verdes e os caracóis
enfeitem teus cabelos de verões.


Corre atrás da vida com ternura de criança
e canções plenas de paz
e com risos de palhaços
porque tudo, todos nos
brincamos de viver bem
sempre, sempre
num carrossel
no circo da vida.



Alvina Nunes Tzovenos
In: Palavras ao Tempo
(Porto Alegre- RS- 1929)

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

VIVER É DESAFIAR


(John William Waterhouse, British Painter, 1849-1917)

Mulher,
Teu nome é coragem!
Viva inteira os teus papéis,
A tua multiplicidade...
Não permita cerceamento,
Persiga a felicidade!
Exiba o sentimento,
A essência, o desafio
E a coragem.
Retoma as rédeas!
Nada de fraquejar!
Arquiteta o teu destino,
Pois viver é desafiar,
Enfrentar as tormentas
E chegar em alto mar.

Selma Regina de Moraes

quinta-feira, 27 de agosto de 2009



Formatação da amiga e poetisa Regina Helena.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Quando eu passar a porta escura



Quando eu passar a porta escura
e minha ausência deixar saudade
quando sentires minha falta tanta,
e for tamanha a dor que sintas,
abre meu livro em qualquer hora,
e então me leias e me devora.

Vais descobrir minhas lembranças,
de meus amores tempo afora,
das muitas coisas que fui e fiz,
de tantas outras que quis outrora.

Frases de mim, do que fui e sou,
coisas de ti, entre palavras,
falo de amores, falo de mágoas,
falo de tudo porque passei,
porque pequei, porque paguei.

Relembro encontros que me ensinaram,
muitos alguéns que já não importam
Mostro a minha vida que vivo agora,
mais feliz por me entender
e atender meus desejos todos,
alguns tão tolos,outros nem tantos,
mas sempre puros.
Quando eu passar a porta escura,
lembra de mim assim.

Luiz Alberto dos Santos Monjeló

(Queríamos deixar registrada as nossas desculpas ao poeta Monjeló, porque anteriormente, postamos esse poema como sendo de Aníbal Beça. Corrigimos e novamente pedimos mil desculpas.)

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

VERDADE


(Paint by Emile Vernon)

No fundo,
Somos todos crianças,
Em permanente aprendizado.

Felizes
Os vêem essa verdade,
Sem deixar que a natural
E humana fragilidade
Seja desculpa
Para o enfrentamento
De cada obstáculo,
De cada desafio
Que nos darão bagagem,
Discernimento e preparo
Para o final dessa viagem.

Esse experimento
Fortalece, enobrece...
Sem a perda da ternura
E da esperança
Que nos faz
Ser sempre uma criança.

Selma Regina de Moraes
(Rio de Janeiro)

'Ondas Dentro de Mim'


(Charles Chaplin,French Academic Painter, 1825-1891)

Amei , com a delicadeza de quem segura nas mãos
uma bolha de sabão
com o cuidado de quem tece fios de seda,
acalentei a própria vida
Esperei, como quem contempla o sol
após a chuva torrencial
Desejei, como quem almeja a paz
depois que o estrondo jaz
Não contemplo águas paradas
persigo o movimento que há nas estradas
Hoje, não é o fim
encontro ondas dentro de mim
ainda amo, acalento, espero, desejo..
transformo cada momento num ensejo


Úrsula Avner
(Minas Gerais)

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Destes tristes dobrados da canção



Destes tristes dobrados da canção,
da ágrafa manhã, ágrafo ardor,
ressoa-se dos sorrisos dos irmãos,
tristeza céu do azul tardia dor.

Cante, cante do pássaro, dor sino,
se sutil deste pássaro, à tardinha,
fazendo deste voar látego do hino,
murmúrio desta voz paz da ladainha.

Se tangem destas tardes dos passos,
se batem destas flores brandos pálio,
deste homem sofrido, dos ossos.

Da tristeza, refrãos da tarde ardor,
tenho apenas versos do salário,
tangendo sutil poeta desta dor.


Eric Ponty
(Minas Gerais)

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Instância



Quem volta ao lugar perdido
quer ver o tempo.
Não vê a casa, o muro, o degrau mais fino:
quer no bater do coração o antigo.

Espanta a resistência daquela árvore,
a mesma e outra nesta floração.
Espanta a cor fiel dos azulejos,
a penumbra e o tom daquele quarto
desenhados na pauta de outros olhos.

Quem retorna não mora no outro tempo,
embora imite o rosto ancestral.
Quem retorna medita. Não cruza o corredor
como planava a mosca distraída.

Pode-se sentar na escada, prover os olhos
com a massa do cenário inocente.
Livre-se o coração para a verdade
desta árvore em gala de outro amor.

Alcides Villaça
In: Viagem de Trem-1988-
(Atibaia- São Paulo-1946)

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

ENSAIO



Levanta-te – é preciso; o Sol inda abastece
o cimo da consciência e a voz o verbo, uivante,
acende na memória a tocha flamejante
da rima cobiçada ao verso que enternece.

Registra pois, em tempo, o sonho – doce amante
que paira além da vida e que contempla a messe
já posta no celeiro, assim, do que fenece,
importa muito pouco ao cérebro escaldante.

Levanta-te e contempla a música irrequieta
que nasce dentro d’alma e baila, tal profeta
ao ter codificado a luz do pensamento...

Ensaia o vôo agora; insiste nas alturas.
Quando a alma se equilibra, além das desventuras,
por certo estará pronta a desposar o vento.


Jandira Grillo
In: Uma Canção de Amor para Você
Academia Amparense de Letras

FRAGA E SOMBRA



A sombra azul da tarde nos confrange.
Baixa, severa, a luz crepuscular.
Um sino toca, e não saber quem tange
é como se este som nascesse do ar.

Música breve, noite longa. O alfanje
que sono e sonho ceifa devagar
mal se desenha, fino, ante a falange
das nuvens esquecidas de passar.

Os dois apenas, entre céu e terra,
sentimos o espetáculo do mundo,
feito de mar ausente e abstrata serra.

E calcamos em nós, sob o profundo
instinto de existir, outra mais pura
vontade de anular a criatura.

Carlos Drummond de Andrade
in: Claro Enigma -1951-

terça-feira, 18 de agosto de 2009

TEMA DA ROSA / I



Parecia uma rosa madrugando
Aquela rosa ali, naquele dia.
Era quando em redor amanhecia,
Porém sem Lugar-Onde ou Tempo-Quando,
Estava eterna e eterna parecia.
Não se sabia a luz que a estava olhando,
Ou se ela olhava a luz desabrochando,
Nem se era dela que esta luz surgia.
Nada movia em torno, mas da haste
Parecia vibrar, tensa e nervosa,
A onda de um acorde num segundo
Sonhando em rubro e alheio a seu engaste,
Que era a história das rosas numa rosa,
A rosa em si, dentro de si, no mundo.

Jorge Wanderley
De Manias de Agora (1995)
(Pernambuco-1938-1999)

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

RESQUÍCIO



Às vezes
A dor de chuvas passadas
Cai em mim fina,
Reelaborada,
A ponto de não ser eu
Assim mais que bolhas
Na espuma da tarde
Molhada.

(Fernando Campanella)

“GITANO”


('Gypsy with a Mandolin'by Jean- Baptiste Camille Corot)


amor cigano
é bela viola
oco de dentro
em canto por fora

asas que arrastam
é ave rompante

beijos que explodem
e viram abóbora

luas em transe
vagas de mar
jades que chamam

areias que cedem
- sereia de tranças
onde vou me enredar

febre do mato
amor vaga-lume

vinhos que encorpam
em porres baratos

grifes que deixam
perfumes prescritos

fome de romãs
nos entreatos


(Fernando Campanella)


Nossa pequena homenagem a maravilhosa poeta Patrícia Neme, que hoje aniversaria.
Muito obrigada pelos versos que nós presenteias com tanto carinho e amor.
Que teu caminho seja repleto das cores da alegria, e se pedras houver, que sejam pequenas e se desfaçam com o vento da paz.
Muito grata por existires e seres como és!
Parabéns pelo aniversário.
14/08/2009


(Patrícia Neme)

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

PRINCÍPIO REVERSO



Toda estória tem dois lados,
como a moeda da própria história.
Como o dia e a noite,
como o gelo e o fogo:
verão, inverno, céu e inferno.

Toda memória tem dois fados,
como a beleza e a falácia da glória.
Como o imóvel e o veloz,
como o crédulo e o néscio:
lume, escuro, verão e inverno.

Toda história tem dois fardos,
como a sacola e o silêncio do viajante.
Como a tristeza e a grandeza do nascer,
como a pura luz e o tempo voraz:
espaço, sal, sangue
e o infinito terror do viver.


- Jairo De Britto -

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

EVANGELHO DA SOMBRA E DO SILÊNCIO


("Rainy Day" by Alexander Volkov)


O silêncio das Coisas me comove;
Sinto-o, principalmente quando chove.

Que sonolência enerva as almas... Que apatia...
Que saudade da vida e da alegria!

Que saudade de tudo que ama e existe!
Como me encanta a natureza triste!

Olho através dos vidros da janela:
A paisagem desfaz-se em folhas amarelas...

Ver árvores é um grande lenitivo
Para a estesia de um contemplativo.

Ver árvores é ouvir sentidas trovas,
Vossas cantigas, raparigas novas!

Que lindo verde, em nuanças meio incertas,
Margeando, lado a lado, as estradas desertas!

As árvores dos parques e das praças
Bebem silêncio pelas folhas que são taças...

Só parece que a sombra em redor se avoluma
E cresce e desenrola o amplo manto de bruma.

É tudo calma. Em torno à minha casa
Não se escuta sequer um ruflo de asa.

Somente a água que vem da montanha, sonora,
Canta tão triste que não canta, chora.

E some-se, rezando a estranha reza
Da livre religião da natureza,

Ave, Sombra! Eu venero a tua imagem
E amo o silêncio verde da paisagem!...



Olegário Marianno
Toda uma Vida de Poesia – 1.957 –
(1889-1958- Recife)

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

circunflexo



O vôo circunflexo de uma ave,
ponto de exclamação e convergência
de um olhar mais que nítido: vazado.
(- E, transpassada por um vento externo e interno,
a praça, com janelas para a praça.)


Deixamos de esperar que alguma dança
perdoe nosso espaço alucinado.
O desenho dos gestos se extravia,
A dor se agrava, grava em nós seu mapa.


Pouco faltou para que nosso invento
tivesse sopro, fosse além do traço:
navegação, mais rápida que a barca,
ia tecendo sua própria água.


As linhas, uma a uma, caem mortas
Diante desta manhã, trava, aguçada
Pelas doces palavras desarmadas.


Rubens Rodrigues Torres Filho
In: O Vôo Circunflexo

‘Busca’



Na rua escura caminho, enquanto a chuva cai
formando com as minhas lágrimas
uma densa cortina que não me separa
da dor de te buscar

Em meio ao som da chuva
ouço o meu coração
batendo na cadência dos meus passos,
arrastando a água...

tudo é inútil, eu sei
e vejo agonizar em mim a esperança.
...e então, mergulho de vez na embriaguez
da mística loucura da saudade.

Regina Helena

domingo, 9 de agosto de 2009

CONFISSÃO DE PAI PARA FILHO


( Nanu Ram Jogi)

Filho, abro a janela para o amanhã
e não há nisso um vestígio de esperança.

Aceito a imposição de um novo dia
enquanto aguardo a hora do pão fresco.

Vivo intensamente o nada de em seguida
como um centauro ultrapassando o mito.

O que faço não marca o acontecimento,
senão o fechamento nulíparolunar
das portas dos dias das horas do tempo.

Sento-me à mesa e repito com a fome
o golpe traiçoeiro da abastança.

Filho, abro o jornal e devoro uma notícia
que custou um sangue anônimo qualquer.

Eu não quero ser cúmplice do mundo.
Vou ao trabalho ou não vou,
ponho a gravata ou não ponho.

Afinal eu sou o que não muda o curso
de nada segundo a minha preferência.

Qualquer alternativa é uma imposição
do agora ilhado no tempo.

O passado foi e o futuro é na cozinha
onde a carne está sendo retalhada...

Enquanto isso, $uborno com produtos
importados a viciada alfândega do coração,
malgrado os impostos escorchantes
devidos à amável consciência...


A. Estebanez

Um feliz e especial dia a todos os pais amigos desse blog!

"SPLEENBORED"



Llorar por todo lo que se perdió
Lloro por mí, que me perdí de mí..
Por quién he sido – y si es que esto ocurrió…
Como yo soy… Y como lloro así.

Hasta llorar por quién ya me olvidó
Llorar por nada… Lo que no és tán malo…
Tan solamente llorar por llorar
Desde el comienzo de mi propio fin.

Dejadme quieto, borracho de asombro
Sin la resaca de todo mi llanto
De una pasión que vive en desatino.

Dejadme el llanto por mi amada rosa
Porqué aún creo que el rocío es canto
De la semilla en su final destino.

Afonso Estebanez
(Dedicado com carinho à minha Mestra
Maria Madalena Cigarán Schuck
Versão: Patrícia Neme)

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

O céu é sempre o mesmo: as nossas almas



O céu é sempre o mesmo: as nossas almas
É que se mudam, contemplando-o. É certo.
Umas vezes está cheio de palmas;
Outras vezes é só como um deserto.

Quem sabe quando vem as horas calmas?
Quem sabe se a ventura vem bem perto?
Homem de carne infiel, em vão espalmas
As tuas asas pelo céu aberto.

O que nos cerca é a fugitiva imagem
Do que sentimos, do que longe vemos,
Sempre sofrendo, sempre em vassalagem.

A vida é um barco a voar. Soltem-se os remos...
Cada um de nós da morte é servo e pagem:
Somos felizes só porque morremos.


Alphonsus de Guimaraens
In: 'Obra completa'

Fiz do verde meu caminho...



Fiz do verde meu caminho,
fiz da vida plantação;
plantei flor e passarinho,
filhos, versos e oração.
Plantei pão e plantei vinho,
com o amor da minha mão.
Caminhei por verdes mares,
fiz sorrir verdes olhares,
verde foi o meu jardim.
Verde foi minha esperança
no verdor das minhas tranças...
Hoje restam só lembranças
com as quais brinco cantares
da ventura que há em mim.
O Senhor é meu pastor
e nas verdes pradarias
me regala paz sem fim!

- Patricia Neme -

domingo, 2 de agosto de 2009

O dia



Das profundezas da tarde vem o dia em que se vive eternamente
igual à água múrmura entre os rochedos
onde se ocultam na antemanhã os peixes perseguidos pelos
homens.

Não se percebe o outro dia melodioso lá fora
nas perspectivas dos arranha-céus, nos cinemas e no trânsito.
A hora tem uma espessura de segredo guardado
e as gargantas de onde as sedes emigraram
suplicam apenas o que sobrou do frio e do sono.

As imprecações dormem no ar, com uma resistência de anjos,
e as doçuras se desfiguram numa ilusão de joelhos fendidos
n'água

como se os corpos sentissem que o tempo foi embora.
A vida, liberta dos vocabulários eventuais, festeja-se sem
memória

no espírito acorrentado a um infinito agora
eternamente presente como o oceano nas praias.


Lêdo Ivo
(Cântico, 1949.)
(Maceió - 1924)

EPITALÂMIO



Apenas as gotas de chuva: compassadas e mansas.
A folhagem, lá fora, adormeceu feliz.
Despertando na relva, cantam grilos baixinho.
A confidência da chuva, a confidência dos grilos,
Tudo que vem da noite é surdina e doçura.

Certeza não direi, mas direi: esperança.
Deves pensar em mim neste momento mesmo.
Teu pensamento é o meu, tua esperança é a minha.
Através do espaço,não é verdade? as nossas mãos
Estão apertadas, em segredo.
Sinto que o nosso amor era grande como a noite
E que o melhor de nós habita na distância
Que nos espera.


Ribeiro Couto
In Poesias Consagradas Vol.3
(São Paulo- 1898-1963)

“Os objetos”



As coisas monótonas repetem-se ao clima habitual:
um retângulo de janela, um cinzeiro, uma bilha, a paisagem
(algumas vezes o céu administra pássaros que, ao
instalar-se no espaço, anunciam outra imagem).

Apelo às lâmpadas domesticadas, cuja luz
intervém em meu procedimento mínimo e forte.
Mas os objetos têm uma certa serenidade que produz
em tempo disponível, n’alma, os pânicos da morte.

Vejo-os diários, metódicos, sólidos e agressivos,
por sua íntima certeza de símbolos urgentes
dominando o real absurdo, onde trazem, cativos,
os abstratos homens, ilógicos e impotentes.

Sou a única atitude na inércia das pedras mortas
reciprocamente solidárias, a transcorrer.
E já me resta apenas o recurso de cerrar todas as portas
aguardando a ideal identificação: morrer.


Lago Burnett
(Maranhão- 1929-1995)

TRISTEZA DA RUA



A tristeza da rua
vem dos que vêm e que vão.
Dos que não querem chegar aonde vão
e vão andando.
Dos que não têm aonde ir
e vão andando.
Dos que não têm pra onde voltar
e vão voltando.
Dos que voltam sem trazer
o que foram buscar.

Geraldino Brasil

RECEITA DE PERFUME


(Tilia cordata Mill)

de altura máxima
ressangra e basta
o sol botão

assombra valeriano
os espinheiros:
tílias

que coram glaucas
puras
em tudo amorosas:

não pede
luz
o íntimo das rosas

Antonio Fernando de Franceschi
in A Olho Nu

(Photo que ilustra o poema é de Moitas61- Flick)